Quarto Domingo do Advento
20 de Dezembro de 2020
A Anunciação. Esta deve ser uma das cenas mais frequentemente pintadas da história da arte. Uma das minhas versões favoritas é a do pintor do séc. XVI Pontormo, que mostra Maria subindo uma escada, virando-se para trás, com um pé entre degraus, ao ser surpreendida pela presença do anjo atrás de si. Ele capta a desprevenida inocência da sua juventude ao encontrar um mundo maior do que ela alguma vez tinha pensado ou suspeitado. A partir deste momento, ela é acordada do seu sonho de infância e começa a ser uma mulher que irá amar e sofrer intensamente. É-lhe dito que será conhecida por Deus. Deus espera e ela consente.
Os Evangelhos e, muito mais, a tradição posterior enfatizam a virgindade de Maria. Seja qual for a forma como compreendamos o significado desta doutrina, ela evoca o estado de pura abertura e a capacidade de se ser surpreendido até mesmo por aquilo que, por longo tempo, se desejou fortemente. No mundo antigo, a virgindade era vista como um estado espiritual elevado, ainda que frágil. Na cultura moderna, é tratada como divertida e transitória. Mas estas são atitudes sociais. Uma mais profunda visão mística pode ser encontrada na ideia monástica de recuperar a virgindade (seja de onde for que o indivíduo comece) como uma grávida harmonia do corpo e espírito, plena de potência e de jubilosa esperança. Esta é a prontidão em que o despertar, o eterno nascimento, da Palavra de Deus pode acontecer em nós e a Palavra se torna a nossa própria carne. Eu acho que isto é mais o que os evangelhos estão a tentar invocar, mas requer uma leitura de um tipo mais contemplativo. Não se sente mais virginal, neste sentido, depois da meditação?
Esta é uma cena arquetípica e inesquecível que faz começar o tique-taque da vida de Jesus. O estado virginal de Maria permite que o diálogo com o anjo aconteça sem auto-consciência e sem que nós o sintamos como sendo falso. De certa forma, o crente sente, que realmente aconteceu. Porém será para sempre estranho. O que está a ser discutido entre Maria e Gabriel é um evento no tempo que impregna o tempo com eternidade. Esse mesmo evento atira ao ar a dualidade entre Deus e a criatura. Ela voa para longe da vista e, quando desce à terra, no ventre dela, estes dois são inseparáveis e um só.
O coração puro e cheio de juventude de Maria e a sua concepção duma nova vida juntam-se na criação duma nova expressão no tempo da eterna não dualidade de Deus. A Humanidade consegue ver a sua própria fonte e o seu caminho de regresso na “beleza de quebrar o coração dos seus jovens”. A partir de Nazaré e de Belém, esta beleza humana torna-se agora impossível de desenredar de Deus, que é sempre mais jovem do que nós. Mesmo nos piores e mais feios pensamentos ou atos da Humanidade, esta beleza sempre aí estará para nos salvar de nós mesmos.
Texto original, em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/2020/12/13/third-sunday-of-advent-2020-gaudete-sunday/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
http://www.meditacaocrista.com/
https://www.facebook.com/meditacaocristaportugal
https://www.youtube.com/user/meditacaocristaTv
20 de Dezembro de 2020
A Anunciação. Esta deve ser uma das cenas mais frequentemente pintadas da história da arte. Uma das minhas versões favoritas é a do pintor do séc. XVI Pontormo, que mostra Maria subindo uma escada, virando-se para trás, com um pé entre degraus, ao ser surpreendida pela presença do anjo atrás de si. Ele capta a desprevenida inocência da sua juventude ao encontrar um mundo maior do que ela alguma vez tinha pensado ou suspeitado. A partir deste momento, ela é acordada do seu sonho de infância e começa a ser uma mulher que irá amar e sofrer intensamente. É-lhe dito que será conhecida por Deus. Deus espera e ela consente.
Os Evangelhos e, muito mais, a tradição posterior enfatizam a virgindade de Maria. Seja qual for a forma como compreendamos o significado desta doutrina, ela evoca o estado de pura abertura e a capacidade de se ser surpreendido até mesmo por aquilo que, por longo tempo, se desejou fortemente. No mundo antigo, a virgindade era vista como um estado espiritual elevado, ainda que frágil. Na cultura moderna, é tratada como divertida e transitória. Mas estas são atitudes sociais. Uma mais profunda visão mística pode ser encontrada na ideia monástica de recuperar a virgindade (seja de onde for que o indivíduo comece) como uma grávida harmonia do corpo e espírito, plena de potência e de jubilosa esperança. Esta é a prontidão em que o despertar, o eterno nascimento, da Palavra de Deus pode acontecer em nós e a Palavra se torna a nossa própria carne. Eu acho que isto é mais o que os evangelhos estão a tentar invocar, mas requer uma leitura de um tipo mais contemplativo. Não se sente mais virginal, neste sentido, depois da meditação?
Esta é uma cena arquetípica e inesquecível que faz começar o tique-taque da vida de Jesus. O estado virginal de Maria permite que o diálogo com o anjo aconteça sem auto-consciência e sem que nós o sintamos como sendo falso. De certa forma, o crente sente, que realmente aconteceu. Porém será para sempre estranho. O que está a ser discutido entre Maria e Gabriel é um evento no tempo que impregna o tempo com eternidade. Esse mesmo evento atira ao ar a dualidade entre Deus e a criatura. Ela voa para longe da vista e, quando desce à terra, no ventre dela, estes dois são inseparáveis e um só.
O coração puro e cheio de juventude de Maria e a sua concepção duma nova vida juntam-se na criação duma nova expressão no tempo da eterna não dualidade de Deus. A Humanidade consegue ver a sua própria fonte e o seu caminho de regresso na “beleza de quebrar o coração dos seus jovens”. A partir de Nazaré e de Belém, esta beleza humana torna-se agora impossível de desenredar de Deus, que é sempre mais jovem do que nós. Mesmo nos piores e mais feios pensamentos ou atos da Humanidade, esta beleza sempre aí estará para nos salvar de nós mesmos.
Texto original, em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/2020/12/13/third-sunday-of-advent-2020-gaudete-sunday/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
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