A razão pela qual tantos católicos abandonaram a Igreja e se integram nas tradições orientais é porque desconhecem a existência e a riqueza da nossa própria tradição contemplativa. Eis que habitáveis dentro de mim, e eu, lá fora, a procurar-Vos! Se hoje ouvires a voz de Deus, não endureças o coração. |
Meditação e Oração
"Prestai atenção ao modo como escutais" A oração é mais do que a oração mental, é mais do que falar com ou falar sobre Deus. A oração é estar com Deus. Quando as nossas orações não são atendidas só uma coisa é certa: nessa altura, o desafio da vida é vivê-la de modo diferente. E é através da oração que descobriremos como proceder. Ao ver Jesus ser levado para fora da cidade, compreendemos que não podemos esperar mais para nós. Ao ver Jesus deprimido no Jardim das Oliveiras, compreendemos que a depressão não é uma perda de fé, é o momento da fé. Ao ver Jesus perder o favor das autoridades, aprendemos que as autoridades não são a medida final das nossas vidas. Quando me liberto pelo silêncio, quando não mais estou envolvido em calcular a vida mas em vivê-la, posso descobrir uma forma de oração em que efetivamente não há distrações. Toda a minha vida se torna oração. Todo meu silêncio está repleto de oração. O mundo de silêncio em que me acho imerso contribui para minha oração. Que mais queres, ó alma, e que mais procuras fora de ti, se dentro de ti tens as tuas riquezas, os teus deleites, a tua satisfação? O teu Amado, Aquele que a tua alma deseja e busca? Rejubila-te e alegra-te no teu recolhimento interior com Ele, pois o tens tão perto. A oração contemplativa começa quando todo o pensamento discursivo acaba, quando a mente descansa em silêncio na presença de Deus. Este é o convite, frente a tantas feridas que nos magoam e nos podem levar à tentação de endurecermos: Rasgai os corações para experimentar na oração silenciosa e serena a suavidade da ternura de Deus. |
Qual a diferença entre 'rezar' e 'meditar'?
A resposta dada pelo líder da WCCM a uma pergunta muito frequente e que lhe foi feita a ele,
Laurence Freeman OBS, em Lisboa, na conferência "A Espiritualidade Celta e a sua importância no desenvolvimento da Peregrinação e da Contemplação" que decorreu no Centro Galego de Lisboa a 29-04-2012. "A razão pela qual tantos católicos abandonaram a Igreja e se integram nas tradições orientais é porque desconhecem a existência e a riqueza da nossa própria tradição contemplativa." Há um breve momento , um piscar de olho, em que perdemos tudo incluindo a nós próprios. Então surge o amor, uma luz iluminando toda a realidade assim como o sol faz surgir a cor, para nunca mais ser esquecido.
Uma definição muito antiga de oração descreve-a como “a elevação do coração e da mente para Deus”. O que é a “mente”, o que é o “coração”? A mente é o que pensa - ela questiona, planeja, preocupa-se, fantasia. O coração é o que sabe – ele ama. A mente é o órgão do conhecimento, o coração, o órgão do amor. A consciência mental precisa eventualmente ceder e abrir-se à forma mais plena de conhecer, que é a consciência do coração. O amor é conhecimento total.
Entretanto, a maior parte de nosso treino em oração limita-se à mente. Fomos ensinados, quando crianças a dizer as nossas orações, a pedir a Deus o que necessitamos para nós ou para outros. Mas esta é apenas uma das metades do mistério da oração. A outra metade é a oração do coração, onde não estamos a pensar em Deus ou a falar com ele ou a pedir-lhe alguma coisa. Permanecemos simplesmente com Deus, que habita em nós pelo Espírito Santo que nos foi dado por Jesus. O Espírito Santo é o amor, o relacionamento de amor que flui entre Pai e Filho. Foi este Espírito que Jesus infundiu em cada coração humano. A meditação é, portanto, a oração do coração que nos une com a consciência humana de Jesus, no Espírito. “Não sabemos rezar como convém, mas o próprio Espírito Santo reza dentro de nós”. (Romanos 8.26) Podemos estabelecer regras para a oração mental – oração com palavras ou utilizando pensamentos sobre Deus. Existem muitos “métodos de oração mental”, mas para a oração do coração não há técnica ou regras: “Onde está o Espírito, está a liberdade." (2 Coríntios 3:17) O Espírito Santo na Igreja moderna, especialmente após o Concílio Vaticano do início dos anos 60, tem-nos ensinado a recuperar esta outra dimensão da oração. Os documentos do Concílio, tanto sobre a Igreja como sobre a liturgia, deram ênfase à necessidade de desenvolver “uma orientação contemplativa” na vida espiritual dos Cristãos. Todos são chamados à plenitude da experiência de Cristo, qualquer que seja o seu tipo de vida. Isto significa que devemos ir além do nível da oração mental: falar com Deus, pensar em Deus, pedir a Deus as nossas necessidades. Precisamos chegar às profundezas, aonde o próprio espírito de Jesus está orando no nosso coração, no silêncio profundo da sua união com o nosso Pai, no Espírito Santo. A oração contemplativa não é privilégio de padres e freiras ou de tipos místicos especiais. É a dimensão da oração a que somos chamados. Não se trata de experiências extraordinárias ou estados alterados de consciência. É o que Tomás de Aquino chamava “simples gozo da verdade”. William Blake falou da necessidade de “limpar as portas da perceção” para que possamos ver tudo como realmente é: infinito. Tudo isto diz respeito à consciência contemplativa na vida de todos os dias. A meditação leva-nos a isto e faz parte do mistério total da oração de qualquer pessoa que esteja procurando a plenitude do ser.
QUIETUDE NO CENTRO
A finalidade de uma roda é movimentar uma carroça. A oração é a roda que movimenta a nossa vida espiritual em direção a Deus. Para girar, a roda precisa de estabelecer contacto com o chão. Se não tocar no chão, a roda não pode movimentar a carroça; ela ficará somente girando em torno de si mesma. Por isso é preciso que haja um tempo e um lugar na nossa vida diária que dedicamos à oração. Os raios da roda são como as diferentes formas de oração. Todas as formas de oração são válidas e eficazes. Temos a Eucaristia, a oração de intercessão, os sacramentos, a leitura da Escritura e as devoções pessoais. O que mantém os raios juntos e faz virar a roda é o eixo central. Os raios convergem nele. Podemos pensar no eixo central como sendo a Oração de Cristo que habita no nosso coração. No eixo central da roda existe imobilidade. Sem o ponto fixo no centro, a roda não pode girar. A meditação consiste em atingir a quietude no centro do nosso ser. Quando meditamos, atingimos esta quietude central que é a fonte de toda a nossa ação, o nosso movimento para Deus através de Cristo dentro de nós. O movimento da roda requer imobilidade no centro. Esta é a relação que existe entre ação e contemplação. |
O centrar-se no outro do Cristão desperto não é apenas condição para a oração. É essencialmente a condição da oração, o próprio estado de oração. Será sempre acompanhado por um compromisso pessoal de experiência diária de oração como um voltar-se plenamente para Deus, longe de qualquer distração e atividade, tudo o que não seja a concentração unicamente em Deus. Um Cristão assim está a cumprir a injunção de S. Paulo de ‘orar sem cessar’, porque o olho interno da sua consciência foi aberto pelo contacto redentor com o amor de Cristo e está permanentemente atento à sua presença interior. Assim todo o Cristão é chamado a ser uma pessoa de oração. |