
Terceiro Domingo da Quaresma - Reflexões para a Quaresma 2018
Ex 20:1-17 – 1Cor 1:22-25 – Jo 2:13-25.
Depois da Páscoa irei com um grupo de peregrinos ao mais antigo mosteiro cristão, o de Santa Catarina, no sopé do Monte Sinai. Moisés, segundo a primeira leitura de hoje, recebeu os Dez Mandamentos na nuvem que cobria a montanha, depois de ter deixado o seu povo e de a ter subido. Iremos também ver a Sarça Ardente, mas creio que já não estará em chamas.
Há um poder real – e um benefício para a nossa viagem interior – para ser encontrado visitando os lugares sagrados da nossa própria tradição ou das dos outros. A peregrinação simboliza o processo de purificação, simplificação e transformação a que chamamos o nosso caminho espiritual – uma viagem que não é menos interior do que exterior porque, finalmente, transcende todas as dualidades. Sem o sagrado – na forma de espaço ou tempo ou ritual – a nossa vida fica diminuída, subalimentada pelo poder do símbolo. Mas é fácil polarizar o sagrado e o secular, o místico e o racional, quando, nesta busca humana em que todos estamos, ambos precisam de ser integrados e transcendidos.
O filme Os Dez Mandamentos de Cecil B de Mille, um êxito de bilheteira de Hollywood dos anos 60, com Charlton Heston no papel de Moisés, foi fiel à narrativa mítica da primeira leitura de hoje, mas é não-convincente e risível hoje em dia. Temos que suspender a nossa descrença em ordem a lermos este tipo de história, não acreditar nela literalmente. Ao não a entender correctamente, o fundamentalismo trai a revelação. Nesse estado de suspense, a verdade do símbolo pode ser sentida. Ver isto faz parte da viagem espiritual que fazemos da infância à maturidade.
S. Paulo amadureceu com um choque – do qual vemos evidências na segunda leitura – quando Cristo explodiu na sua consciência. Ele passou pelo desmoronar da dualidade que acontece quando mergulhamos no paradoxo, comparável com os astronautas da Ficção Científica que levam a sua nave para o interior dum buraco negro e descobrem novas dimensões da realidade. Para Paulo, Cristo é o olho de todo o paradoxo, crucificado e ressuscitado, loucura para o mundo, sabedoria na dimensão divina, aparentemente fraco mas de facto forte.
No evangelho de hoje, Jesus limpa o Templo. Expulsa os cambistas juntamente com os que dirigem a indústria de sacrifício de animais. As autoridades ficam escandalizadas e com razão. Sem comerciantes, como é que o Templo se vai autosustentar, como sem dúvida lhes foi dito que devia acontecer? Um tal comportamento é também horrível para o turismo, como os ataques terroristas no Egipto há alguns anos. Mas quando o sagrado se torna profano, ele exige ser destroçado, razão pela qual a História da Religião está cheia de movimentos de reforma.
Vemos no final do evangelho, porém, que Jesus não estava preocupado em dirigir um movimento bem-sucedido. Se O entendermos, sigamo-Lo; se não, bem, esperemos. Este desapego face à Sua própria mensagem também nos impulsiona para além do literalismo e da dualidade, para entrarmos num nível mais profundo de realidade, subindo mais alto na montanha sagrada. Qualquer meditante compreenderia, pela leitura deste texto, que também nós temos que purificar o templo do nosso coração de qualquer pensamento ou prática, por muito razoável que seja, que a traia.
Com amor,
Laurence
Texto original, em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2018/
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