Sexta-feira da Segunda Semana
(Génesis 37: 3-28)
“Eis que se aproxima o homem dos sonhos” disseram uns aos outros. “Vamos, matemo-lo, atiremo-lo a qualquer cisterna e depois diremos que um animal feroz o devorou. Então veremos como se realizarão os seus sonhos.”
Esta passagem é tirada da história dos irmãos de José, ciumentos porque ele era o favorito de seu pai, conspirando para o fazer desaparecer. Eles não o queriam matar – isso iria trazer-lhes má sorte – mas planeavam deixá-lo a morrer, lentamente, no fundo dum poço. Isto expõe a escondida história do mundo e boa parte da nossa vida de família e da política religiosa e civil. É perturbadora a frequência com que o ciúme opera como o factor decisivo no nosso comportamento. Mesmo Deus é um “Deus ciumento”. Um comentário zeloso, defendendo o significado literal a todo o custo, diz: “o ciúme de Deus é apropriado e bom”. O ciúme é uma inevitável consequência do favoritismo: uma raça escolhida, o profeta que supera todos os predecessores, os salvos, os eleitos sob qualquer forma. Porém, como é difícil para o monoteísta, ansiando ser amado mais do que os outros, acreditar (como S. Paulo) que “Deus não tem favoritos”.
Você provavelmente tem um programa antivírus no seu computador. Ele protege-nos do terrorismo digital de indivíduos ocultos, isolados, que provavelmente acabam por sentir que só se ligam aos outros online. A persona online é uma aposta arriscada. Então, nós precisamos de uma verificação interior, também – exame de consciência, alerta espiritual, guardar o coração. Vírus como o ciúme, o racismo ou o perfeccionismo espreitam a partir dos ocultos anexos no mais profundo dos nossos discos rígidos. A meditação procura-os e expulsa-os. Temos que estar preparados para a luta que eles nos vão dar antes de serem apagados – ou de a sua energia ser convertida na nossa original bondade. A Quaresma é um tempo adequado para esta limpeza da Primavera.
As modernas e abastadas culturas dão grande atenção às escolhas relacionadas com o estilo de vida e a formas de melhorar o nosso bem-estar físico e psicológico. Quantas conversas sobre a actualidade andam à volta de alimentos que são “bons para nós”, o mais recente vegetal das celebridades, dietas que vão salvar o mundo, novas pérolas de sabedoria esotérica reveladas para todos. Estas “descobertas” e as reacções que evocam no moderno consumidor-de-novidades dão a sensação de que são um bando de pássaros que levanta voo em conjunto e desviando-se em interminável mudança de direções. Muito menos atenção é dada ao nosso estado mental.
Cuidamos menos daquilo que permitimos que a nossa mente absorve e em que se torne concentrada ou viciada. Por isso, o adepto de vida e comida saudáveis de hoje em dia pode parecer uma “virgem orgulhosa” dos primeiros séculos. Podemos ser tão cuidadosos (e correctos) a um nível e no entanto deitar tudo a perder noutro. O orgulho, tal como o ciúme, é a nossa habitual perdição. Tudo o que é necessário para fazer deste critério-duplo um dissimulado estilo de vida é que haja um número suficiente de pessoas que concorde connosco.
Porque é que amamos os nossos próprios “sonhos” tanto e tantas vezes desprezamos ou ridicularizamos os sonhos de outros? Partilhar um sonho pode inspirar o auto-sacrifício e serviço. Ou pode desencadear um pesadelo colectivo e transformar os mais vulneráveis em bodes expiatórios. Vigiem os vossos sonhos.
Inspeccionar a nossa mente profunda à procura de vírus e testar a vivacidade dos nossos sonhos – este é o trabalho da oração pura. O único teste seguro é abrir mão de todas as representações das nossas esperanças e crenças – conceptuais, verbais ou visuais. O que quer que regularmente sobreviver a esta limpeza radical da nossa mente é digno de confiança (a maior parte do tempo).
Reflexões para a Quaresma 2019 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original, em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2019/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
http://www.meditacaocrista.com/
https://www.facebook.com/meditacaocristaportugal
(Génesis 37: 3-28)
“Eis que se aproxima o homem dos sonhos” disseram uns aos outros. “Vamos, matemo-lo, atiremo-lo a qualquer cisterna e depois diremos que um animal feroz o devorou. Então veremos como se realizarão os seus sonhos.”
Esta passagem é tirada da história dos irmãos de José, ciumentos porque ele era o favorito de seu pai, conspirando para o fazer desaparecer. Eles não o queriam matar – isso iria trazer-lhes má sorte – mas planeavam deixá-lo a morrer, lentamente, no fundo dum poço. Isto expõe a escondida história do mundo e boa parte da nossa vida de família e da política religiosa e civil. É perturbadora a frequência com que o ciúme opera como o factor decisivo no nosso comportamento. Mesmo Deus é um “Deus ciumento”. Um comentário zeloso, defendendo o significado literal a todo o custo, diz: “o ciúme de Deus é apropriado e bom”. O ciúme é uma inevitável consequência do favoritismo: uma raça escolhida, o profeta que supera todos os predecessores, os salvos, os eleitos sob qualquer forma. Porém, como é difícil para o monoteísta, ansiando ser amado mais do que os outros, acreditar (como S. Paulo) que “Deus não tem favoritos”.
Você provavelmente tem um programa antivírus no seu computador. Ele protege-nos do terrorismo digital de indivíduos ocultos, isolados, que provavelmente acabam por sentir que só se ligam aos outros online. A persona online é uma aposta arriscada. Então, nós precisamos de uma verificação interior, também – exame de consciência, alerta espiritual, guardar o coração. Vírus como o ciúme, o racismo ou o perfeccionismo espreitam a partir dos ocultos anexos no mais profundo dos nossos discos rígidos. A meditação procura-os e expulsa-os. Temos que estar preparados para a luta que eles nos vão dar antes de serem apagados – ou de a sua energia ser convertida na nossa original bondade. A Quaresma é um tempo adequado para esta limpeza da Primavera.
As modernas e abastadas culturas dão grande atenção às escolhas relacionadas com o estilo de vida e a formas de melhorar o nosso bem-estar físico e psicológico. Quantas conversas sobre a actualidade andam à volta de alimentos que são “bons para nós”, o mais recente vegetal das celebridades, dietas que vão salvar o mundo, novas pérolas de sabedoria esotérica reveladas para todos. Estas “descobertas” e as reacções que evocam no moderno consumidor-de-novidades dão a sensação de que são um bando de pássaros que levanta voo em conjunto e desviando-se em interminável mudança de direções. Muito menos atenção é dada ao nosso estado mental.
Cuidamos menos daquilo que permitimos que a nossa mente absorve e em que se torne concentrada ou viciada. Por isso, o adepto de vida e comida saudáveis de hoje em dia pode parecer uma “virgem orgulhosa” dos primeiros séculos. Podemos ser tão cuidadosos (e correctos) a um nível e no entanto deitar tudo a perder noutro. O orgulho, tal como o ciúme, é a nossa habitual perdição. Tudo o que é necessário para fazer deste critério-duplo um dissimulado estilo de vida é que haja um número suficiente de pessoas que concorde connosco.
Porque é que amamos os nossos próprios “sonhos” tanto e tantas vezes desprezamos ou ridicularizamos os sonhos de outros? Partilhar um sonho pode inspirar o auto-sacrifício e serviço. Ou pode desencadear um pesadelo colectivo e transformar os mais vulneráveis em bodes expiatórios. Vigiem os vossos sonhos.
Inspeccionar a nossa mente profunda à procura de vírus e testar a vivacidade dos nossos sonhos – este é o trabalho da oração pura. O único teste seguro é abrir mão de todas as representações das nossas esperanças e crenças – conceptuais, verbais ou visuais. O que quer que regularmente sobreviver a esta limpeza radical da nossa mente é digno de confiança (a maior parte do tempo).
Reflexões para a Quaresma 2019 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original, em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2019/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
http://www.meditacaocrista.com/
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