Sábado depois das Cinzas
No espírito de peregrinação – seja a meditação ou seja a busca da vida – repetimos coisas de modo a melhor compreender o significado daquilo que relembramos. Ao fazê-lo, re-apresentamos o passado como uma dimensão do agora em que estamos. O tempo é, deste modo, visto pelo telescópio e a paz que sentimos ao fazer isto mostra que, pelo menos por agora, passámos além do medo do tempo que é sempre, essencialmente, o medo da morte.
Tentando seguir a Jesus em todos os aspectos da nossa vida, como profesor, amigo e encarnação da verdade, relembramos momentos-chave da Sua vida. Isto não é para nos fixarmos no Jesus histórico: “o que é que Jesus faria se estivesse aqui” não é realmente uma questão de fé. A fé diz que Ele está aqui. Nós re-membramo-nos a nós mesmos ao Jesus histórico em ordem a ficarmos mais agudamente cientes da presença da Sua Ressurreição. Assim nos sentimos certa manhã, quando renovámos as nossas promessas baptismais no Rio Jordão.
Como Mark Twain apontou de imediato, o Jordão não é o Mississipi. É riozinho muito modesto, que tem uma imaginativa presença em muitas histórias bíblicas bem além do seu tamanho real. De modo similar o campo do Armagedão, que faz parte da política da direita cristã americana para o Médio Oriente, onde a batalha final entre o bem o mal deverá acontecer, quando todos os judeus tiverem regressado a Israel, é mais ou menos do tamanho dum campo de futebol. Quando regressei a uma casa da minha infância passados muitos anos fiquei profundamente desorientado por ela ser tão pequena, como se eu fosse um gigante numa casa de bonecas.
A imaginação religiosa precisa de ser controlada, razão pela qual um tipo de oração apofática, não baseada em imagens, é uma ascese essencial numa religião saudável. O facto de Jesus ter sido baptizado por João parece ter sido difícil de explicar para alguns dos primeiros cristãos. Como poderia o Messias, o Filho de Deus, precisar de ser baptizado? Para nós é óbvio o porquê, quando renovamos as antigas promessas e inclinamos a cabeça para permitir que outra pessoa verta água sobre nós. Porque precisamos dos outros. O facto de Jesus ter inclinado a cabeça como nós fazemos, reforça a Sua humanidade e ilumina a nossa.
A peregrinação física, que é uma forma dramática de lectio, torna-nos familiar o que significa a Palavra fazer-se carne. Não é apenas a descida do divino para dentro do humano, mas uma revelação daquilo de que a Humanidade é capaz e para que está destinada. Deus tornou-se humano, como repetiam frequentemente os Padres da Igreja, em ordem a que os seres humanos se pudessem tornar Deus.
Que isto não requer uma batalha cósmica ou a destruição dos nossos inimigos torna-se evidente na gloriosa normalidade da vida de Jesus. Aquele em cujas pegadas nós estamos a caminhar conheceu a vida duma aldeia, gozou a companhia dos amigos e da família, foi a uma festa de casamento. A significância do Seu sinal é a de que o divino está plenamente vivo dentro de toda a experiência humana da vida, do nascimento à morte e em tudo o que está entre estes.
Reflexões para a Quaresma 2020 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original , em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2020/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
http://www.meditacaocrista.com/
https://www.facebook.com/meditacaocristaportugal
No espírito de peregrinação – seja a meditação ou seja a busca da vida – repetimos coisas de modo a melhor compreender o significado daquilo que relembramos. Ao fazê-lo, re-apresentamos o passado como uma dimensão do agora em que estamos. O tempo é, deste modo, visto pelo telescópio e a paz que sentimos ao fazer isto mostra que, pelo menos por agora, passámos além do medo do tempo que é sempre, essencialmente, o medo da morte.
Tentando seguir a Jesus em todos os aspectos da nossa vida, como profesor, amigo e encarnação da verdade, relembramos momentos-chave da Sua vida. Isto não é para nos fixarmos no Jesus histórico: “o que é que Jesus faria se estivesse aqui” não é realmente uma questão de fé. A fé diz que Ele está aqui. Nós re-membramo-nos a nós mesmos ao Jesus histórico em ordem a ficarmos mais agudamente cientes da presença da Sua Ressurreição. Assim nos sentimos certa manhã, quando renovámos as nossas promessas baptismais no Rio Jordão.
Como Mark Twain apontou de imediato, o Jordão não é o Mississipi. É riozinho muito modesto, que tem uma imaginativa presença em muitas histórias bíblicas bem além do seu tamanho real. De modo similar o campo do Armagedão, que faz parte da política da direita cristã americana para o Médio Oriente, onde a batalha final entre o bem o mal deverá acontecer, quando todos os judeus tiverem regressado a Israel, é mais ou menos do tamanho dum campo de futebol. Quando regressei a uma casa da minha infância passados muitos anos fiquei profundamente desorientado por ela ser tão pequena, como se eu fosse um gigante numa casa de bonecas.
A imaginação religiosa precisa de ser controlada, razão pela qual um tipo de oração apofática, não baseada em imagens, é uma ascese essencial numa religião saudável. O facto de Jesus ter sido baptizado por João parece ter sido difícil de explicar para alguns dos primeiros cristãos. Como poderia o Messias, o Filho de Deus, precisar de ser baptizado? Para nós é óbvio o porquê, quando renovamos as antigas promessas e inclinamos a cabeça para permitir que outra pessoa verta água sobre nós. Porque precisamos dos outros. O facto de Jesus ter inclinado a cabeça como nós fazemos, reforça a Sua humanidade e ilumina a nossa.
A peregrinação física, que é uma forma dramática de lectio, torna-nos familiar o que significa a Palavra fazer-se carne. Não é apenas a descida do divino para dentro do humano, mas uma revelação daquilo de que a Humanidade é capaz e para que está destinada. Deus tornou-se humano, como repetiam frequentemente os Padres da Igreja, em ordem a que os seres humanos se pudessem tornar Deus.
Que isto não requer uma batalha cósmica ou a destruição dos nossos inimigos torna-se evidente na gloriosa normalidade da vida de Jesus. Aquele em cujas pegadas nós estamos a caminhar conheceu a vida duma aldeia, gozou a companhia dos amigos e da família, foi a uma festa de casamento. A significância do Seu sinal é a de que o divino está plenamente vivo dentro de toda a experiência humana da vida, do nascimento à morte e em tudo o que está entre estes.
Reflexões para a Quaresma 2020 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original , em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2020/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
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