Segunda-feira da Segunda Semana
É difícil meditar quando temos uma dor de dentes ou estamos sobrecarregados pela tristeza, ansiedade, fome ou até por ter o nariz a pingar. Nos tempos da fé colectiva as pessoas entendiam melhor o conselho para se manterem saudáveis para poderem rezar. Hoje em dia, quando achamos difícil ir além da “minha experiência” enquanto teste e significado de todas as coisas, procuramos a meditação como uma ferramenta para o “bem-estar”.
Talvez o problema seja o termos que mergulhar na parte mais funda. Temos tão pouca boa formação religiosa e espiritual para nos preparar para o sofrimento ou para a disciplina duma prática centrada-no-outro como a meditação. Porém, tendo perdido tanto do que dá significado e equilíbrio à vida, temos que entrar na parte funda e começar a meditar quando e por qualquer razão que possamos encontrar. Então finalmente, se perseverarmos, iremos descobrir que a própria experiência nos ensina uma lição preciosa: a irmos para além da nossa experiência.
Digamos que já meditamos regularmente. A vida é calma e regular e tem brilho e promessas. De súbito, uma aflição – a morte de alguém que amamos, uma perda pessoal, uma separação ou rejeição, uma doença – desaba sobre a nossa vida e um ferrolho penetra na nossa alma. Continuamos a meditar porque a prática – independentemente da fase do ciclo de crescimento em que possamos estar nessa altura – fez o seu caminho e instalou-se na nossa pele e nos nossos biorritmos. Somos meditantes agora: isso faz tanto parte de nós como a respiração. Mas quando nos sentamos e tentamos dizer o mantra a nossa mente parece mais distraída do que no primeiro dia neste trabalho. Extractos de cenas que ainda não ocorreram rasgam a nossa imaginação. Ansiedade, dor, raiva e tristeza são deixadas à solta e como um bando de rufias invadem o nosso quarto interior e arruínam o nosso ordenado espaço pessoal.
Nós sabemos que está a acontecer e que irá passar. Mas quando? Estes são momentos, como um intervalo soalheiro num dia de temporal, em que nos sentimos na paz do Senhor e sabemos que a alegria está sempre-a-brotar aí. No entanto, a batalha do pensamento e do sentimento está a ser perdida. O tumulto dos pensamentos é imparável porque eles vêm de sentimentos que não podem ser controlados. Não se pode argumentar com eles. Dizemos: “essa é uma ideia sem sentido” ou “não vale a pena preocupar-me com isso, não há nada que eu possa fazer agora”. Mas os sentimentos na zona do coração e no plexo solar que manifestam estes pensamentos têm vida própria.
Em momentos como estes aprendemos porque é que Jesus dizia: ”não vos preocupeis, ponham os vossos atribulados corações em descanso, tende fé em Mim”, sabendo perfeitamente bem como isso é difícil. Porém, para a pessoa de fé, faz um mundo de diferença relembrar estes ensinamentos. É tão difícil esperar sem exigências ou expectativas, medos ou esperanças, tão difícil não planear para um futuro irreal que primeiramente temos que construir na imaginação antes de podermos fantasiar sobre ele. É a irrealidade de tudo isto que é tão pesada. E cansativa. Estamos em conflito: desamparadamente a imaginar o que poderia acontecer, atirados da esperança para o desespero; mas também detestando o fim do tempo de espera porque poderá vir, realmente, o pior que imaginámos.
Algures, no meio de tudo isto, o mantra vai soando. E algo está a ensinar-nos.
Reflexões para a Quaresma 2020 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original , em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2020/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
http://www.meditacaocrista.com/
https://www.facebook.com/meditacaocristaportugal
É difícil meditar quando temos uma dor de dentes ou estamos sobrecarregados pela tristeza, ansiedade, fome ou até por ter o nariz a pingar. Nos tempos da fé colectiva as pessoas entendiam melhor o conselho para se manterem saudáveis para poderem rezar. Hoje em dia, quando achamos difícil ir além da “minha experiência” enquanto teste e significado de todas as coisas, procuramos a meditação como uma ferramenta para o “bem-estar”.
Talvez o problema seja o termos que mergulhar na parte mais funda. Temos tão pouca boa formação religiosa e espiritual para nos preparar para o sofrimento ou para a disciplina duma prática centrada-no-outro como a meditação. Porém, tendo perdido tanto do que dá significado e equilíbrio à vida, temos que entrar na parte funda e começar a meditar quando e por qualquer razão que possamos encontrar. Então finalmente, se perseverarmos, iremos descobrir que a própria experiência nos ensina uma lição preciosa: a irmos para além da nossa experiência.
Digamos que já meditamos regularmente. A vida é calma e regular e tem brilho e promessas. De súbito, uma aflição – a morte de alguém que amamos, uma perda pessoal, uma separação ou rejeição, uma doença – desaba sobre a nossa vida e um ferrolho penetra na nossa alma. Continuamos a meditar porque a prática – independentemente da fase do ciclo de crescimento em que possamos estar nessa altura – fez o seu caminho e instalou-se na nossa pele e nos nossos biorritmos. Somos meditantes agora: isso faz tanto parte de nós como a respiração. Mas quando nos sentamos e tentamos dizer o mantra a nossa mente parece mais distraída do que no primeiro dia neste trabalho. Extractos de cenas que ainda não ocorreram rasgam a nossa imaginação. Ansiedade, dor, raiva e tristeza são deixadas à solta e como um bando de rufias invadem o nosso quarto interior e arruínam o nosso ordenado espaço pessoal.
Nós sabemos que está a acontecer e que irá passar. Mas quando? Estes são momentos, como um intervalo soalheiro num dia de temporal, em que nos sentimos na paz do Senhor e sabemos que a alegria está sempre-a-brotar aí. No entanto, a batalha do pensamento e do sentimento está a ser perdida. O tumulto dos pensamentos é imparável porque eles vêm de sentimentos que não podem ser controlados. Não se pode argumentar com eles. Dizemos: “essa é uma ideia sem sentido” ou “não vale a pena preocupar-me com isso, não há nada que eu possa fazer agora”. Mas os sentimentos na zona do coração e no plexo solar que manifestam estes pensamentos têm vida própria.
Em momentos como estes aprendemos porque é que Jesus dizia: ”não vos preocupeis, ponham os vossos atribulados corações em descanso, tende fé em Mim”, sabendo perfeitamente bem como isso é difícil. Porém, para a pessoa de fé, faz um mundo de diferença relembrar estes ensinamentos. É tão difícil esperar sem exigências ou expectativas, medos ou esperanças, tão difícil não planear para um futuro irreal que primeiramente temos que construir na imaginação antes de podermos fantasiar sobre ele. É a irrealidade de tudo isto que é tão pesada. E cansativa. Estamos em conflito: desamparadamente a imaginar o que poderia acontecer, atirados da esperança para o desespero; mas também detestando o fim do tempo de espera porque poderá vir, realmente, o pior que imaginámos.
Algures, no meio de tudo isto, o mantra vai soando. E algo está a ensinar-nos.
Reflexões para a Quaresma 2020 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original , em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2020/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
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