Sábado da Quinta Semana
Numa crise, sentindo-nos incertos sobre como ou se ela irá terminar, ouvindo uma miríade de opiniões e previsões de pessoas que acabaram de ouvir alguma coisa em que querem que acreditemos, o que é que há para fazer excepto simplesmente “fazer a próxima coisa”?
Bastantes vezes, descobrimos a coragem que não sabíamos que tínhamos, simplesmente ao fazer a próxima coisa confiantemente e sem delongas. O grande inimigo é sempre o adiamento induzido pelo medo. Obedecer sem demora, diz S. Bento. Em tempos de crise, mal sabemos a que é que estamos a obedecer. Porém tantas vezes, não saber qual será a próxima coisa depois da próxima coisa faz com que as coisas corram melhor do que poderíamos ter esperado ou imaginado.
As crises chegam de muitas maneiras. Podem aproximar-se furtivamente de nós ou, de repente, dar-nos um encontrão lateral e fazer-nos ir a rebolar por uma estrada escorregadia. Uma crise real porém é sempre mais do que um temporário desafio ou perturbação. Está lá na manhã seguinte e na manhã depois dessa e durante tanto tempo quanto conseguimos antever. Não há imaginação ou desejo que faça reverter o que aconteceu. Essa é a sua finalidade que revolve o estômago, a sua inevitabilidade.
Apesar disso, ela continua a assumir novas formas, novos medos, novas questões sobre o porquê e sobre se alguma vez terá fim. Será que sobrevivemos a ela? Numa perturbação temporária, esta questão pode fazer-nos cair em nós: “bem, é claro que com o tempo irei recuperar”, dizemos para nós mesmos. Mas, numa crise real não sabemos. Apenas sabemos que há uma real possibilidade de não sobrevivermos. Talvez esta seja a última. A esperança depende de encararmos essa possibilidade.
Cada vez mais, numa crise real e cada vez mais profunda, compreendemos que jamais haverá um retorno à forma como as coisas eram e, no entanto, não temos a certeza se o que está à nossa frente é a beira dum precipício ou um novo mundo. O tempo dirá que tipo de crise foi este coronavírus. Muitos sentem que a vida não será nunca mais a mesma, que a recuperação será dura e pode haver uma mudança fundamental, para bem ou para mal. E também não conseguimos saber se e por quanto tempo iremos recordar as lições aprendidas durante a parte pior de tudo isto.
Tudo isso é a médio e longo prazo. O que temos que encarar agora é a próxima coisa a fazer, com tudo fechado, trabalhando a partir de casa ou dependendo dos outros para nos mantermos vivos ou abastecidos. Será que entramos em parafuso ou será que iremos delicadamente, corajosamente, mergulhar no momento presente, fazendo a próxima coisa com presença de espírito? Temos que manter o nosso equilíbrio mental, aprendendo, ao mesmo tempo, a abdicar de muitos dos hábitos mentais que nos desequilibravam no passado. É a isto que me quero referir com a descoberta dum caminho contemplativo para atravessar a crise. Não se trata de nos tornarmos subitamente religiosos ou piedosos.
Significa deixar ir a ansiedade e o medo e o estarmos sempre a tentar espreitar o outro lado da esquina, predizendo o futuro de forma a podermos controlá-lo. A meditação é a forma de treinar para o fazer. Os frutos da meditação são muitos e tranquilamente revolucionários. Mas não esperem experiências dramáticas ou revelações. Esperem até verem que estão a fazer a próxima coisa com calma e clareza, apesar de sentirem medo e ansiedade. Isso mostra que estamos num caminho contemplativo e que a vida tem propósito e direção. Duas vezes ao dia, a meditação é a próxima coisa.
Reflexões para a Quaresma 2020 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original , em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2020/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
http://www.meditacaocrista.com/
https://www.facebook.com/meditacaocristaportugal
Numa crise, sentindo-nos incertos sobre como ou se ela irá terminar, ouvindo uma miríade de opiniões e previsões de pessoas que acabaram de ouvir alguma coisa em que querem que acreditemos, o que é que há para fazer excepto simplesmente “fazer a próxima coisa”?
Bastantes vezes, descobrimos a coragem que não sabíamos que tínhamos, simplesmente ao fazer a próxima coisa confiantemente e sem delongas. O grande inimigo é sempre o adiamento induzido pelo medo. Obedecer sem demora, diz S. Bento. Em tempos de crise, mal sabemos a que é que estamos a obedecer. Porém tantas vezes, não saber qual será a próxima coisa depois da próxima coisa faz com que as coisas corram melhor do que poderíamos ter esperado ou imaginado.
As crises chegam de muitas maneiras. Podem aproximar-se furtivamente de nós ou, de repente, dar-nos um encontrão lateral e fazer-nos ir a rebolar por uma estrada escorregadia. Uma crise real porém é sempre mais do que um temporário desafio ou perturbação. Está lá na manhã seguinte e na manhã depois dessa e durante tanto tempo quanto conseguimos antever. Não há imaginação ou desejo que faça reverter o que aconteceu. Essa é a sua finalidade que revolve o estômago, a sua inevitabilidade.
Apesar disso, ela continua a assumir novas formas, novos medos, novas questões sobre o porquê e sobre se alguma vez terá fim. Será que sobrevivemos a ela? Numa perturbação temporária, esta questão pode fazer-nos cair em nós: “bem, é claro que com o tempo irei recuperar”, dizemos para nós mesmos. Mas, numa crise real não sabemos. Apenas sabemos que há uma real possibilidade de não sobrevivermos. Talvez esta seja a última. A esperança depende de encararmos essa possibilidade.
Cada vez mais, numa crise real e cada vez mais profunda, compreendemos que jamais haverá um retorno à forma como as coisas eram e, no entanto, não temos a certeza se o que está à nossa frente é a beira dum precipício ou um novo mundo. O tempo dirá que tipo de crise foi este coronavírus. Muitos sentem que a vida não será nunca mais a mesma, que a recuperação será dura e pode haver uma mudança fundamental, para bem ou para mal. E também não conseguimos saber se e por quanto tempo iremos recordar as lições aprendidas durante a parte pior de tudo isto.
Tudo isso é a médio e longo prazo. O que temos que encarar agora é a próxima coisa a fazer, com tudo fechado, trabalhando a partir de casa ou dependendo dos outros para nos mantermos vivos ou abastecidos. Será que entramos em parafuso ou será que iremos delicadamente, corajosamente, mergulhar no momento presente, fazendo a próxima coisa com presença de espírito? Temos que manter o nosso equilíbrio mental, aprendendo, ao mesmo tempo, a abdicar de muitos dos hábitos mentais que nos desequilibravam no passado. É a isto que me quero referir com a descoberta dum caminho contemplativo para atravessar a crise. Não se trata de nos tornarmos subitamente religiosos ou piedosos.
Significa deixar ir a ansiedade e o medo e o estarmos sempre a tentar espreitar o outro lado da esquina, predizendo o futuro de forma a podermos controlá-lo. A meditação é a forma de treinar para o fazer. Os frutos da meditação são muitos e tranquilamente revolucionários. Mas não esperem experiências dramáticas ou revelações. Esperem até verem que estão a fazer a próxima coisa com calma e clareza, apesar de sentirem medo e ansiedade. Isso mostra que estamos num caminho contemplativo e que a vida tem propósito e direção. Duas vezes ao dia, a meditação é a próxima coisa.
Reflexões para a Quaresma 2020 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original , em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2020/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
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