Segunda-feira da Quinta Semana
O que é que é normal? Certa vez, estava eu falar com alguém que tinha sido grandemente magoado e se sentia profundamente traído por um amigo. O amigo tinha, segundo penso, agido mal. Porém, era mais fácil para mim ser “objectivo” e pensar: “bem, talvez não quisessem magoar esta pessoa e talvez não soubessem realmente o que estavam a fazer”. Isto é muito mais fácil de dizer quando nós próprios não estamos na cruz.
Jesus alcançou a mais alta objectividade, não aquela falsa a partir da qual a maior parte de nós se arroga falar. Ela é alcançada na base da maior subjectividade – quando Ele se conheceu a Si mesmo totalmente e estava prestes a entregar o Seu Espírito à Sua fonte, deixando de estar separado de qualquer maneira, e abandonando qualquer apego a Si mesmo. Ele estava na Cruz naquele momento e disse: “Pai, perdoa-os pois não sabem o que fazem”. É interessante que não tenha dito: “Pai, Eu perdoo-os”…
Quando sou “eu” quem concede o perdão, há demasiado apego pessoal à dor e ao drama do perdão. Ao invocar o perdão para a chocante e brutal ignorância dos Seus inimigos, a partir do alicerce do ser, Ele estava a estabelecer contacto com a própria fonte. As Suas últimas palavras ensinam-nos até onde Ele tinha chegado e aquilo que deveríamos almejar.
Enfim, voltemos a esta vida. A pessoa com quem eu estava a falar, que se sentia traída, estava a analisar e a condenar a pessoa que a tinha magoado. Todos o fazemos, tentando compreender como é que isto podia ter acontecido, explicando-o duma forma que culpa mas finge ser objectiva. A maior parte das vezes, hoje, usamos linguagem da psicologia. Talvez haja alguma verdade na avaliação psicológica que fazemos dos outros. Mas pode não ser ainda uma verdade que tenhamos merecido o direito de usar. Isso torna-se óbvio quando dizemos algo como: “simplesmente, não é normal. Algo está mal… há algo anormal neles.” Jesus não disse, sobre a Sua última aflição, “simplesmente, não é normal”. De facto, era apenas demasiado normal: culparmos os outros e crucificá-los por forma a protegermo-nos da verdade. Não há nada mais normal nos relacionamentos humanos e nas instituições, do que a criação de bodes expiatórios.
É difícil até para o mais devoto cristão dizer exactamente o que a Cruz faz pelo mundo e porque é que é importante. De facto, fora da radiância da Ressurreição, é impossível fazê-lo. Mas, uma partícula útil da verdade total do mistério do Seu sofrimento e morte é que ela denuncia a falsidade, o auto-engano, o terror da verdade que nos dói, da qual fazer dos outros bodes expiatórios é uma das maneiras de fugirmos.
O sofrimento, e todos o estamos a experienciar nesta crise, deve ser evitado ou reduzido, se pudermos. Mas se não podemos, que aprendamos com ele. Esperemos que, depois disto passar e nós começarmos a recuperação, tenhamos uma melhor compreensão do que realmente significa “normal”. Utilização normal do tempo, condições climáticas normais, relacionamentos normais. O modo como utilizamos este tempo pode ajudar-nos a descobrir o centramento e o equilíbrio que a Cruz também simboliza. Então estaremos menos propensos a culpar e mais prontos para agir bem. Simplesmente sendo quem somos (como Jesus fez), seremos agentes da mudança para o normal que é real.
Reflexões para a Quaresma 2020 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original , em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2020/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
http://www.meditacaocrista.com/
https://www.facebook.com/meditacaocristaportugal
O que é que é normal? Certa vez, estava eu falar com alguém que tinha sido grandemente magoado e se sentia profundamente traído por um amigo. O amigo tinha, segundo penso, agido mal. Porém, era mais fácil para mim ser “objectivo” e pensar: “bem, talvez não quisessem magoar esta pessoa e talvez não soubessem realmente o que estavam a fazer”. Isto é muito mais fácil de dizer quando nós próprios não estamos na cruz.
Jesus alcançou a mais alta objectividade, não aquela falsa a partir da qual a maior parte de nós se arroga falar. Ela é alcançada na base da maior subjectividade – quando Ele se conheceu a Si mesmo totalmente e estava prestes a entregar o Seu Espírito à Sua fonte, deixando de estar separado de qualquer maneira, e abandonando qualquer apego a Si mesmo. Ele estava na Cruz naquele momento e disse: “Pai, perdoa-os pois não sabem o que fazem”. É interessante que não tenha dito: “Pai, Eu perdoo-os”…
Quando sou “eu” quem concede o perdão, há demasiado apego pessoal à dor e ao drama do perdão. Ao invocar o perdão para a chocante e brutal ignorância dos Seus inimigos, a partir do alicerce do ser, Ele estava a estabelecer contacto com a própria fonte. As Suas últimas palavras ensinam-nos até onde Ele tinha chegado e aquilo que deveríamos almejar.
Enfim, voltemos a esta vida. A pessoa com quem eu estava a falar, que se sentia traída, estava a analisar e a condenar a pessoa que a tinha magoado. Todos o fazemos, tentando compreender como é que isto podia ter acontecido, explicando-o duma forma que culpa mas finge ser objectiva. A maior parte das vezes, hoje, usamos linguagem da psicologia. Talvez haja alguma verdade na avaliação psicológica que fazemos dos outros. Mas pode não ser ainda uma verdade que tenhamos merecido o direito de usar. Isso torna-se óbvio quando dizemos algo como: “simplesmente, não é normal. Algo está mal… há algo anormal neles.” Jesus não disse, sobre a Sua última aflição, “simplesmente, não é normal”. De facto, era apenas demasiado normal: culparmos os outros e crucificá-los por forma a protegermo-nos da verdade. Não há nada mais normal nos relacionamentos humanos e nas instituições, do que a criação de bodes expiatórios.
É difícil até para o mais devoto cristão dizer exactamente o que a Cruz faz pelo mundo e porque é que é importante. De facto, fora da radiância da Ressurreição, é impossível fazê-lo. Mas, uma partícula útil da verdade total do mistério do Seu sofrimento e morte é que ela denuncia a falsidade, o auto-engano, o terror da verdade que nos dói, da qual fazer dos outros bodes expiatórios é uma das maneiras de fugirmos.
O sofrimento, e todos o estamos a experienciar nesta crise, deve ser evitado ou reduzido, se pudermos. Mas se não podemos, que aprendamos com ele. Esperemos que, depois disto passar e nós começarmos a recuperação, tenhamos uma melhor compreensão do que realmente significa “normal”. Utilização normal do tempo, condições climáticas normais, relacionamentos normais. O modo como utilizamos este tempo pode ajudar-nos a descobrir o centramento e o equilíbrio que a Cruz também simboliza. Então estaremos menos propensos a culpar e mais prontos para agir bem. Simplesmente sendo quem somos (como Jesus fez), seremos agentes da mudança para o normal que é real.
Reflexões para a Quaresma 2020 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original , em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2020/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
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