Sexta-feira da Quinta Semana
Embora a resposta ao programa Contemplative Path (Caminho Contemplativo) nos tenha mantido online e em contacto com os meditantes em redor do mundo, temos vivido uma vida normal e tranquila em Bonnevaux. Mas ontem eu perturbei a paz por fazer disparar o alarme de incêndio em casa, ao tentar acender o lume na lareira do meu estúdio, porque de repente ficou mais frio por cá. A minha fracassada tentativa produziu nuvens de fumo que vieram para dentro de casa em vez de subir pela chaminé. Pensava que já tinha aprendido a acender o lume com lenha numa pequena lareira. Mas mais uma vez eu descobri o pouco que sei e como é fácil repetir erros.
É claro que, para acender o lume começamos com papel. Quanto colocar é sempre uma decisão difícil. Depois, adiciona-se caruma, pequenos pedaços de lenha ou cartão. Não se consegue ter a certeza se a lenha está suficientemente seca e, por vezes, ela rejeita as nossas tentativas de ignição, As acendalhas que adiciono depois são irritantemente temperamentais e habitualmente apagam-se assim que pomos alguma coisa em cima delas. Ou caiem entre a lenha e o papel e eu tento salvar o lume ateando o papel. Isto produz uma gratificante chama inicial e uma fugaz sensação de sucesso. Eu sinto-me bem-sucedido ou, para ser honesto, simplesmente com sorte. Mas é uma falsa esperança.
Alguns dos pequenos pedaços de madeira finalmente pegam fogo de má vontade. Fico com esperança de que ele se espalhe aos toros maiores que eu tenho estado à espera para colocar. Como sou muito impaciente, habitualmente ponho os toros maiores sobre as chamas recentes com demasiada pressa. Eu espero, eu imagino, eu rezo para que peguem fogo. Mas depois dum momento tudo esmorece. Fiz exigências exageradas às pequenas chamas e esperei demais. Em breve apenas algumas brasas restam. Nesta altura é fácil desesperar. Não é uma grande questão da vida, acender uma lareira, mas o mais pequeno desapontamento pode despoletar momentos mais negros de desespero. O simples sumiço da chave do carro pode alvejar uma série de perdas prévias e mais dolorosas na vida. Porque não acender simplesmente o aquecedor eléctrico?
Mas a minha determinação irlandesa luta contra o desespero. Corro lá fora para buscar um novo fornecimento de pequenos pedaços de madeira. Quando volto as brasas estão quase mortas, mas eu cuidadosamente ponho mais caruma por cima delas. Atiro para lá uma das inúteis acendalhas também. O que é que perco com isso? Deitado no chão sopro longa e fortemente sobre as brasas brilhantes e, por fim, aparecem algumas chamas gloriosas. Encorajante mas não de se fiar.
Aí uma hora mais tarde, depois de frequentes intervenções e experiências de quase morte, o lume arde alegremente. O segredo, é claro, não está naquilo que pomos em cima mas no que está por baixo. Quando os alicerces do lume estão quentes e brilhantes, qualquer coisa que juntemos será consumida. O fogo tal como o amor consome aquilo de que se alimenta. Há uma união gloriosa e acabou-se. O quarto está quase quente demais e são horas de ir para a cama.
Não vos vou maçar com uma explicação desta parábola. Penso que é óbvia. Para a Quaresma. Para uma pandemia. Para a meditação quotidiana.
Reflexões para a Quaresma 2020 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original , em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2020/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
http://www.meditacaocrista.com/
https://www.facebook.com/meditacaocristaportugal
Embora a resposta ao programa Contemplative Path (Caminho Contemplativo) nos tenha mantido online e em contacto com os meditantes em redor do mundo, temos vivido uma vida normal e tranquila em Bonnevaux. Mas ontem eu perturbei a paz por fazer disparar o alarme de incêndio em casa, ao tentar acender o lume na lareira do meu estúdio, porque de repente ficou mais frio por cá. A minha fracassada tentativa produziu nuvens de fumo que vieram para dentro de casa em vez de subir pela chaminé. Pensava que já tinha aprendido a acender o lume com lenha numa pequena lareira. Mas mais uma vez eu descobri o pouco que sei e como é fácil repetir erros.
É claro que, para acender o lume começamos com papel. Quanto colocar é sempre uma decisão difícil. Depois, adiciona-se caruma, pequenos pedaços de lenha ou cartão. Não se consegue ter a certeza se a lenha está suficientemente seca e, por vezes, ela rejeita as nossas tentativas de ignição, As acendalhas que adiciono depois são irritantemente temperamentais e habitualmente apagam-se assim que pomos alguma coisa em cima delas. Ou caiem entre a lenha e o papel e eu tento salvar o lume ateando o papel. Isto produz uma gratificante chama inicial e uma fugaz sensação de sucesso. Eu sinto-me bem-sucedido ou, para ser honesto, simplesmente com sorte. Mas é uma falsa esperança.
Alguns dos pequenos pedaços de madeira finalmente pegam fogo de má vontade. Fico com esperança de que ele se espalhe aos toros maiores que eu tenho estado à espera para colocar. Como sou muito impaciente, habitualmente ponho os toros maiores sobre as chamas recentes com demasiada pressa. Eu espero, eu imagino, eu rezo para que peguem fogo. Mas depois dum momento tudo esmorece. Fiz exigências exageradas às pequenas chamas e esperei demais. Em breve apenas algumas brasas restam. Nesta altura é fácil desesperar. Não é uma grande questão da vida, acender uma lareira, mas o mais pequeno desapontamento pode despoletar momentos mais negros de desespero. O simples sumiço da chave do carro pode alvejar uma série de perdas prévias e mais dolorosas na vida. Porque não acender simplesmente o aquecedor eléctrico?
Mas a minha determinação irlandesa luta contra o desespero. Corro lá fora para buscar um novo fornecimento de pequenos pedaços de madeira. Quando volto as brasas estão quase mortas, mas eu cuidadosamente ponho mais caruma por cima delas. Atiro para lá uma das inúteis acendalhas também. O que é que perco com isso? Deitado no chão sopro longa e fortemente sobre as brasas brilhantes e, por fim, aparecem algumas chamas gloriosas. Encorajante mas não de se fiar.
Aí uma hora mais tarde, depois de frequentes intervenções e experiências de quase morte, o lume arde alegremente. O segredo, é claro, não está naquilo que pomos em cima mas no que está por baixo. Quando os alicerces do lume estão quentes e brilhantes, qualquer coisa que juntemos será consumida. O fogo tal como o amor consome aquilo de que se alimenta. Há uma união gloriosa e acabou-se. O quarto está quase quente demais e são horas de ir para a cama.
Não vos vou maçar com uma explicação desta parábola. Penso que é óbvia. Para a Quaresma. Para uma pandemia. Para a meditação quotidiana.
Reflexões para a Quaresma 2020 - LAURENCE FREEMAN OSB
Texto original , em inglês: aqui
https://laurencefreeman.me/category/lent-reflections-2020/
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
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