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Reflexões para a Quaresma 2021


​LAURENCE FREEMAN OSB 

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Domingo de Páscoa

4/4/2021

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Domingo da Páscoa na Ressurreição do Senhor 
(Evangelho Jo 20: 1-9. Ainda estava escuro quando ela foi ao túmulo)
 
Era muito de manhãzinha no primeiro dia da semana e ainda estava escuro, quando Maria Madalena veio ao sepulcro.
O verdadeiro significado de Madalena entre os discípulos tem sido reavaliado nos anos mais recentes.  Compreendemos como a sua proximidade com Jesus pode ter-se tornado um problema para os membros do “clube dos rapazes”. Uma das maneiras de diminuir o seu papel foi a de a identificar com a prostituta arrependida de quem Jesus expulsa os demónios, embora não exista base para isto. Mas mesmo no relato do evangelho de hoje, ela tem uma eminência, mesmo não sendo cardeal. Ela é a primeira a chegar ao túmulo vazio e então torna-se a apóstola para os Apóstolos. Se a Ressurreição serve para virar o mundo de pernas para o ar e denunciar os seus falsos sistemas de valores, é apropriado que um membro dum grupo não privilegiado, como eram as mulheres, seja o primeiro, como o foi Maria, a dizer: “Eu vi o Senhor!” Ainda está escuro quando Maria chega ao sepulcro. Ela vem tão cedo quanto lhe é permitido. Estarão os outros discípulos ainda a dormir? O reconhecimento e entendimento da Ressurreição começam aqui, mas ainda estão longe de concluídos. Leva-nos tempo, a nós também, para ver. Ainda estamos na escuridão quando a luz começa a alvorecer.

Ela viu que a pedra tinha sido retirada do sepulcro
A pesada pedra que bloqueava a entrada dos túmulos simboliza a separação entre os mortos e os vivos e também os mantém em segurança uns face aos outros. Também em nós mesmos há bloqueios e repressões que não temos a força, por nós mesmos, para mover.

e foi a correr então ter com Simão Pedro e com o discípulo predileto de Jesus: “Levaram o Senhor do sepulcro” disse-lhes, “e não sabemos onde O puseram”.
Nós corremos quando somos energizados por uma urgência ou esperança que não conseguíamos sentir até que alguma coisa a despolete: um comboio que está a partir ou a chegada dum amigo. Ela diz-lhes o que sabia naquele momento e nada mais. Algo vasto pode estar a ponto de aparecer, mas não deve – e não pode ainda – ser posto por palavras, até que a evidência externa seja validada pela experiência interior. Este conhecimento que nasce de uma nova dimensão de nós mesmos tem um longo caminho a percorrer antes de nascer.

Então Pedro partiu com o outro discípulo para irem ao sepulcro. Corriam juntos, mas o outro discípulo antecipou-se, correndo mais depressa do que Pedro e chegou ao sepulcro primeiro;
Pedro, o líder dos doze e João, o discípulo pessoalmente mais chegado a Jesus a um nível humano. Não sabemos como é que cumpriam estes papéis, mas torna a história mais convincente que eles existam na comunidade. Os papéis vão juntos; aqui, eles dois correm juntos. João corre mais rápido – porque é mais novo ou porque é mais energizado por um amor mais forte?

debruçando-se, viu as ligaduras no chão, mas não entrou. Simão Pedro que o seguia, entretanto chegou também, entrou no sepulcro e viu as ligaduras no chão e o sudário que tinha estado sobre a cabeça de Jesus, não com as ligaduras, mas enrolado à parte.
A menção às ligaduras deu azo a posteriores alegações de que o corpo tinha sido levado dali. Que João tenha deixado Pedro entrar primeiro talvez mostre o seu respeito pela posição dele. Até mesmo nos momentos mais importantes da vida, as impressões momentâneas e as preocupações menores estão a agir.

O outro discípulo que chegara primeiro ao sepulcro entrou também: ele viu e acreditou. Até este momento eles ainda não tinham entendido o ensinamento da Escritura, segundo o qual Ele devia ressuscitar dos mortos.
João acreditou primeiro, mas ainda não compreendia plenamente aquilo em que acreditou. Tal como nós. A luz da nova alvorada está a tornar-se mais forte.
Os dois homens vão-se embora. Maria fica no túmulo a chorar e torna-se a primeira a encontrar, a ver e acima de tudo a reconhecer o Cristo ressuscitado. Ela habitou a sua dor, na escuridão, mas traz a luz aos outros.

Digamos juntos: “O Senhor Ressuscitou. Ele está ressuscitado de facto. Aleluia!”
 
­­­­­­______________________________________ 
 
Obrigado pela vossa companhia nestas reflexões ao longo do deserto da Quaresma. Obrigado pelos muitos comentários que me ajudaram a manter-me focado na minha tarefa diária. E obrigado especialmente às equipas de tradutores pela sua paciência com as minhas entregas, às vezes, de última hora, pelo dom fiel das suas capacidades e por ajudarem - a aprofundar - a comunidade de peregrinos que formámos nas últimas seis semanas.

​Páscoa Feliz!
 
Laurence
 



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Sábado Santo - Páscoa 2021

4/4/2021

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Páscoa 2021 - Sábado Santo
 
Uma seleção de Estações da Via Sacra. Para ver a apresentação completa da Via Sacra, com fotos e música, vá a www.wccm.org

Jesus é Condenado à Morte
Jesus está inocente e preenchido-de-verdade. Ele é vítima da injustiça institucional. O processo legal que O condena é que é culpado. Ele é um estranho sem direitos ou respeito. Não tem recursos contra o sistema de poder que ameaçou simplesmente com a força da Sua própria inocência e falando-verdade. Está sozinho. Gozado, Humilhado. Rodeado por uma multidão que se alimenta da sede de sangue. Em Si mesmo, Ele contém as vítimas da desumanidade e injustiça ao longo da história, os que foram erradamente acusados, os torturados, os desaparecidos, os difamados e exterminados. Pelas Suas feridas, a Humanidade, passada e futura, é curada.

Jesus é Forçado a Carregar com a Sua Cruz
Na Sua cruz, todo o sofrimento humano está impresso. É a árvore da dor do mundo. A solidão. A vergonha. A perda. O amor não correspondido. A negligência e o abuso. Será que consigo sentir o meu sofrimento tocado pela Sua cruz? “Tomai sobre vós o Meu jugo e aprendei de Mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para as vossas almas. Pois o meu jugo é ligeiro e o meu fardo leve.” Será que aceitei a Cruz que devo carregar? Será que ela se tornou no Seu jugo?

Jesus Cai pela Primeira Vez
Quando um presidente tropeça num degrau, o mundo solta um grito afogado. Quando uma pessoa colapsa sob o peso do seu sofrimento, será que olhamos para o outro lado? Quando as pessoas com quem trabalhamos sofrem um esgotamento, perdem as estribeiras connosco ou dizem que já não aguentam mais – será que sentimos e compreendemos o peso sob o qual estão colapsando? Cair não é uma falha. É apenas demasiado humano. Será que me sinto envergonhado e acusado quando caio? Será que finjo que sou mais forte do que sou realmente? Já terei descoberto que o poder de Deus se manifesta na fraqueza humana?

Jesus Encontra Sua Mãe
Uma mãe recorda cada momento da existência do seu filho. Vê-la terminar antes da sua constitui a perda mais extrema. Que possamos trazer no coração todos os pais que perderam filhos. E todas as crianças separadas dos seus pais por pobreza, guerra ou abuso. Rezemos para que, na dor do desgosto de Maria a caminho da cruz, todos possam encontrar uma companheira e uma compaixão curadora.

Verónica Enxuga a Face de Jesus
Quando sofremos uma intensa aflição a nossa identidade é destruída. Ficamos sem rosto, irreconhecíveis, anónimos. É um grau de dor além da rejeição. Fixar o olhar no invisível, escutar os sem voz, restaura a identidade no dom da compaixão. E isso deixa uma marca em nós, tal como se diz que a face de Jesus ficou impressa no pano com que ela Lhe limpou a cabeça.

Jesus Morre e É Colocado no Túmulo
O dragão ruge numa árvore vazia. O vazio final não pode ser atingido. Só pode ser aceite, oferecido como a derradeira rendição e o derradeiro abrir mão. Então, o último suspiro é uma perfeita oferta de si mesmo, sem nenhuma esperança de recompensa ou de que alguém testemunhe, mesmo que esteja aos pés da Cruz.

 
Laurence
 
 
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Sexta-feira Santa - Páscoa 2021

4/4/2021

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Páscoa 2021 - Sexta-feira Santa
(Evangelho: Jo 18:1-19:42 Depois de tomar o vinagre, Jesus disse: “Tudo está consumado”.)
 
Se a língua sagrada do Cristianismo é o corpo, o que acontece quando o corpo morre? Quem já esteve com alguém que amava, quando o espírito deixou o seu corpo, conhece aquele sentimento súbito, horrível e espantoso de ausência e separação. O que até aí era uma linguagem viva expressando uma pessoa viva, ainda que com um fio de vida, está agora silencioso e quieto. Mas não é o silêncio ou a quietude da meditação ou daqueles momentos de comunhão em amor, quando a linguagem do corpo expressava perfeitamente a mente e os sentimentos.
 
A pessoa que morreu e começou uma nova viagem tem uma nova linguagem corporal e a separação parece absoluta e final. Temos memórias, relíquias, histórias, sonhos, talvez resquícios de experiências psicológicas. São preciosos e carregados de significado, mas intensificam a sensação de separação, mesmo quando começamos a arrumá-los e ordená-los.
 
O impensável mas demasiado óbvio destino da velha forma que fica para trás não está nas nossas mãos, dele se ocupando os profissionais ou um funeral imediato. Tudo o que o corpo vivo irradiava relativo à maravilha dum ser humano vivo está, agora, num imparável processo de redução à materialidade. A beleza e a maravilha da pele que se estica, respira, cora, comunica, cheira e toca, que elasticamente envolve tudo o que está dentro de nós, desapareceu para sempre. Ao desaparecer a linguagem do corpo de alguém único torna-se só mais um corpo.
 
Tudo o que dá significado à vida é minado pela morte. Se não conseguirmos compreender a morte, a vida não fará sentido. Tudo aquilo por que a morte faz passar os sobreviventes pode ser visto na morte e no sepultamento de Jesus. Os detalhes são quase demasiado realistas: a descida da cruz, a presença da Sua Mãe e dos Seus discípulos amados, Maria e João, os rituais de deposição no túmulo e o ritual final da unção, que teve de ser adiado por razões religiosas. Tudo está num vazio que não pode ser evitado. Encontrar sentido é tudo o que nos resta, mas como? Mesmo depois da Ressurreição, a Igreja debatia-se para explicar o propósito da Cruz. A explicação mais fácil e menos satisfatória foi a “expiação”: Deus exigiu um sacrifício humano para expiar o pecado de Adão. É como pedir a um contabilista para avaliar o valor da vida.
 
O significado da Sua morte está na razão por que foi rejeitado. (Oficialmente, por blasfémia.) Mas o que é que acontece quando recusamos um dom porque aceita-lo exige uma transformação demasiado grande da forma como vemos o mundo e vivemos nele? É habitualmente um dom de amor maior do que o que conseguimos aguentar, o que rejeitamos. A força da rejeição e a liberdade pura do dom oferecido são viradas contra o dador. O amor rejeitado despoleta o ódio.
 
Jesus estava disposto a ser rejeitado (“Ele submeteu-se à morte e morte de cruz”) porque a Sua forma de morrer mostraria a plena natureza do dom que estava a oferecer. Recusou-se a acreditar na rejeição e por isso o dom continuou a ser oferecido. A Cruz, assim, não é um sinal de punição divina, mas de infinito perdão. Quando rejeitamos um dom, a rejeição faz ricochete em nós horrivelmente, com vergonha, negação e culpa. Mas e se virmos que o dador não foi destruído e não procura vingança? O pleno significado torna-se visível num novo corpo.
 
Laurence
 
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Quinta-feira Santa - Quaresma 2021

1/4/2021

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Quaresma 2021 - Quinta-feira Santa
(Evangelho; Jo 13:1-15 “Deveis lavar os pés uns aos outros.”)
 
Isto é o Meu Corpo. Isto é o Meu Sangue. A Eucaristia significa muitas coisas para todos os tipos de cristãos. Alguns católicos sentem-se mal se não forem todos os dias à Missa.  A maioria não vai à Missa, mas sente-se bem por ela estar a ser celebrada algures no mundo a todo o momento. Na imaginação católica, ela é o “sacrifício de Jesus na Cruz”, eternamente oferecido pela salvação do mundo. Entre os Evangélicos ou as Igrejas da Reforma, a Eucaristia nunca ou raramente é celebrada e é vista como uma memória e não como um sacrifício. Lutero pensava que a “Missa Papista” era uma “obra do diabo”. Podemos ver a sua raiva pela maneira como a Igreja de Roma tinha desvirtuado a Missa, transformando-a numa utilidade mágica e numa máquina de fazer dinheiro mas, mesmo assim, talvez ele estivesse a exagerar.
​
Não entremos em polémicas sobre este momento de transcendente maravilha na história cristã, repetido num ritual que revela uma unicidade além das palavras. O que é triste é que para muitos a sacralidade da Eucaristia, que evoluiu da refeição da Páscoa Judaica e que Jesus celebrou na Sua última noite, seja um vazio sem sentido, uma perda de tempo. A minha experiência é a de que a meditação, a prática contemplativa, preenche de novo o vazio com uma plenitude de significado, com a energia do mistério. Os sacramentos como um todo servem de marcos na viagem da vida e são re-encantados ao começarmos a viagem interior. Não magia, mas um sentido de ligação direta à condição humana, começando pelo corpo que somos hoje e consumando-se no corpo transfigurado. O que acontece é o espanto de descobrirmos todo o nosso “eu” como um microcosmos de todo o universo. Isto levou o salmista a cantar uma vez o “como somos feitos de medo e de maravilha”.

Os grandes curadores são como astronautas explorando o cosmos interior, descobrindo e dando nome aos seus sistemas infinitamente integrados que se encontram dentro de redes de ligação cada vez mais subtis. Os primeiros filósofos pensavam no cosmos como música. O corpo, o microcosmos, é mais parecido com esta música do que com o aparelho mecânico a que a ciência médica tende a reduzi-lo. A música é o alimento do amor. Isto é o Meu corpo com os seus oceanos e rios de sangue. “A Minha carne é verdadeira comida, o Meu sangue é verdadeira bebida”, disse Jesus.

As grandes verdades evocam os seus opostos e as grandes luzes causam escuras sombras. A língua sagrada do Cristianismo é o corpo. A Palavra fez-se carne. Jesus não nos deu uma teoria. Deu-nos o Seu corpo. Como é que então os cristãos conseguiram tornar o corpo em algo pecaminoso e os seus maravilhosos sistemas galácticos, como a beleza e a sexualidade, em algo sinistro? Bem, não olhemos demasiado tempo para trás.

Talvez consigam juntar-se online a nós em Bonnevaux para a Eucaristia de hoje. Se assim for, tenham convosco o vosso próprio pão e vinho. Mas tentem celebrá-la de algum modo no princípio do fim da Quaresma. Tudo o que precisam é de um pouco de pão e vinho. Ao ingeri-los, deixem que o vosso corpo se torne o que é agora o d’Ele. É um alimento espantoso para a viagem de descoberta em que estamos quando meditamos.

Laurence



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Quarta-feira da Semana Santa - Quaresma 2021

1/4/2021

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Quaresma 2021 - Quarta-feira da Semana Santa
(Evangelho Mt 26:14 - 25. O Mestre diz: “O Meu tempo está próximo”.)

 
No coração de todas as tradições espirituais está a experiência religiosa, mística, do seu fundador. É o que dá poder ao seu ensinamento e desperta nos seus seguidores um lento sentido de que são chamados ao mesmo conhecimento e união com Deus. Nenhum autêntico mestre espiritual, realmente, nenhum verdadeiro professor, quer reservar para si a sua experiência como uma forma de dominar os outros. Na Última Ceia, Jesus disse aos Seus discípulos: “Eu chamo-vos amigos porque partilhei convosco tudo o que aprendi de Meu Pai”. Isto perturbou-os. Eles preferiam pensar n’Ele como seu mestre – “Nunca me lavarás os pés”, disse Pedro – em vez de um amigo. Mesmo que um saiba mais do que outro, os amigos devem ser iguais.
​
De certa forma, dizer que Ele partilhou tudo com eles não é verdade. Jesus tinha tentado partilhar com eles, mas eles eram lentos a expandir os horizontes para o receber. É sempre perigoso ser um discípulo, aprender, porque somos mudados pelo novo conhecimento. O mundo torna-se tanto mais estranho quanto mais aprendemos. Temos de nos continuar a adaptar a uma nova visão da realidade, o que nos torna vulneráveis. Mas o que Ele disse era verdade; sabia que com o tempo a resistência dos discípulos se iria derreter. Eles ou apenas alguns deles, seriam por fim capazes de receber tudo o que Ele tanto ansiou ensinar-lhes. Mas deixou um depósito que seria ativado depois de os ter deixado e ter regressado duma forma que trazia consigo o conhecimento. Tudo o eles tinham de fazer era reconhecê-Lo. 

A experiência que queria partilhar, pela sua natureza, era para ser partilhada, não possuída. Partilhar é transformação de todos, quer demos quer recebamos. Na plena partilha, a distinção entre mestre e discípulo, também, é transcendida. A tradição mística judaica expressou isto através do conceito “tikkun olam”. É aplicado concretamente às situações sociais e políticas e todo o sofrimento humano pede que ele seja praticado. Significa “reparar o mundo”. “Partilhar tudo” o que aprendemos é a grande cura que corrige o desequilíbrio, o pecado, do mundo e o reorienta na direção de Deus. 

‘‘Tikkun Olam” é espelhado no ideal bodhisattva no Budismo. Os que se comprometem com ele dedicam todos os ganhos da prática espiritual ao alívio do sofrimento no mundo, não neles mesmos. S. Paulo entendia este centramento-no-outro no âmbito do chamamento a conhecer a Deus: “Sou puxado em duas direcções. Quero muito deixar esta vida e estar com Cristo, que é uma coisa muito melhor; mas é mais necessário para vós que eu permaneça no corpo.” (Fl 1:23-24). No Sufismo, também, o indivíduo cujas auto-divisões são curadas no caminho do amor torna-se um agente da unidade para todos os outros. 

A experiência de conhecimento, que Jesus ansiava partilhar não é algo que adicionamos ao que já sabemos. É um dom curativo do “eu” a outro. Quando as multidões faziam pouco de Jesus na Cruz – “Salvou os outros, mas não consegue salvar-se a Si mesmo!” – entenderam mal, mas estavam prontas a aprender.

Laurence

 


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Terça-feira da Semana Santa​ - Quaresma 2021

30/3/2021

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Quaresma 2021 - Terça-feira da Semana Santa
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(Evangelho: Jo 13:21-33, 36-38. Seguir-Me-eis mais tarde)

 
Antigamente, eu costumava tirar alguns dias para ir de carro até Monte Oliveto, a minha casa-mãe monástica, na Toscânia. Era uma viagem solitária, pelas boas estradas francesas. Quando chegávamos à fronteira italiana, porém, começava uma infindável série de túneis longos e curtos, demasiado estreitos para o tráfego moderno e cheios de condutores loucos.

Os túneis não eram tão belos com o resto do caminho. Engoliam-nos na escuridão e depois expeliam-nos para a encandeante luminosidade do sol mediterrânico. Não havia qualquer previsibilidade: alguns duravam quilómetros, outros algumas centenas de metros. Lembrei-me disto quando ontem estava a escrever sobre o desagradável Ano da Covid com que ainda estamos a lutar.

Falamos dele como “a crise”, esquecendo as outras crises com que não conseguíamos lidar antes da Covid e que ainda estão à espera: as alterações climáticas, a democracia, a globalização, a crise de sentido que está na base dos vícios e aos sistemáticos abusos de todos os tipos.

“Oh, não”, podem pensar, “não será isso tudo. Porque é que, em vez disso, não diz alguma coisa agradável sobre a Páscoa?” Concordo e vou tentar. Mas as boas notícias da Páscoa não irão penetrar em nós se não compreendermos aquilo por que estamos a passar nos túneis da nossa mente. A Ressurreição vem só depois da morte, não como um sedativo para a dor de morrer. 

Seria uma absurda subestimação dizer que a Crucifixão foi uma crise na vida de Jesus. A morte não é apenas uma crise. É um fim. Seja qual for a fé e a esperança que possamos ter, um fim tem todos os sinais de finalidade. Perguntem a qualquer pessoa, até mesmo um crente, que tenha perdido um ser querido. É uma experiência inenarrável e indescritível: aquilo a que Hamlet chamava o “país oculto de cujas fronteiras nenhum viajante regressa”. Como é que podemos falar com verdade de algum lugar que ainda não visitámos?

A crise pode fazer-nos ficar deprimidos. Mas a morte é mais do que isso. Pode parecer estranho, mas é mais fácil encontrar a verdadeira esperança na experiência da morte do que a lidar com a crise. Isto é assim porque, na morte, todas as imagens daquilo por que esperamos perecem também no seu escuro túnel. A esperança nasce apenas da morte das esperanças. Por isso, mal reconhecemos a real esperança quando ela chega, tal como os discípulos não reconheceram o Jesus ressuscitado quando Ele regressou para se mostrar a uma nova luz. Compreensivelmente, eles tinham desistido. Estavam ou a fugir ou a regressar às suas redes de pesca. A esperança só aparece depois de esgotadas as falsas esperanças e quando todas as tentativas de negar a realidade fracassaram. A esperança real faz parte da ressurreição, a luz depois da escuridão, a vida depois da morte.

O termo místico para isto é “a noite escura”. Como nos túneis da auto-estrada, a noite escura é impenetrável. Não conseguimos ver para além do fim; e a infindável entrada e saída dos túneis desgasta a nossa fé e até aquilo que pensámos que era a nossa capacidade para a esperança.

“Meu Deus, Meu Deus, porque Me abandonaste?” Este é o ponto de não retorno; mas é também o ponto de retorno.

 
Laurence



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Segunda-feira da Semana Santa - Quaresma 2021

29/3/2021

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Quaresma 2021 - Segunda-feira da Semana Santa

(Evangelho Jo 12:1-11. Maria ungiu os pés de Jesus, secando-os com os seus cabelos)
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Às vezes, não sou muito bom observador. Só ontem é que apreciei plenamente uma coisa que ando a fazer há longo tempo, subindo um estreito carreiro desde a Abadia até ao Celeiro, aqui em Bonnevaux. O carreiro foi-se formando gradualmente, impercetivelmente, ao longo de muito tempo, atravessando todas as condições climáticas, sob a pressão de muitos pares de pés em fila indiana, várias vezes ao dia.

Estava a pensar como descrever o que significa “tradição” numa reunião para jovens, a primeira de uma série mensal. É claro que poderia dizer que “tradição” significa “fazer a ponte + dar”, a entrega em mãos, de uma intuição de sabedoria ou de um simples padrão de comportamento. Mas isso parecia-me um pouco frio porque não descreve o sentimento de descobrir que já pertencemos (em Inglês, belong) a uma tradição: nós “existimos” (be) nesta transmissão contínua e tocamos o nosso profundo “anseio” (long) nela. A ideia de que meramente escolhemos a nossa tradição a partir daquilo que há disponível como oferta, é muito menos interessante e profunda. É um enorme alívio saber que já pertencemos (“existimos-ansiamos”).

Ver o pequeno carreiro que sobe a colina, rasgado entre a erva, que todos fizemos, mês após mês, inconsciente e fielmente, foi também um alívio. Espero que nunca formalizemos este carreirinho e o pavimentemos com gravilha, embora ele possa ficar escorregadio com tempo húmido e, muitas vezes, trazemos bocados de terra para dentro de casa. Assim evolui a tradição.

Enquanto falava com os jovens na nossa reunião intercontinental, pareceu-me que a pertença era uma necessidade essencial neste nosso tempo fragmentado; dar por nós em carreiros que herdamos, mas que também ajudamos a manter e a dar forma. Um deles é o caminho comum da prática espiritual, do profundo autodesenvolvimento. Outro é o caminho da compreensão e do envolvimento com as culturas uns dos outros. Outro ainda é a proteção da nossa casa comum e termos o dever de cuidar, expressando-o compassivamente, àqueles que a Bíblia designa como “anawim”, os pobres, oprimidos e marginalizados. Porém, também se refere, à pobreza em espírito que abraçamos na meditação. Os mais importantes termos no pensamento religioso, cada um deles, tem dois lados. Pensemos em “jihad”, que pode ser sequestrado para se referir apenas ao conflito externo, mas cujo significado mais profundo é interior, o sentido de autodomínio. 

Se um carreiro é criado por se caminhar sobre ele continuamente, ele tem dois lados formados por pares de pés que se movem num caminhar fácil e natural. Uma tradição também é formada por meio do equilíbrio entre os significados exterior e interior. Então, o carreirinho estreito transforma-se numa grande tradição. Torna-se nosso quando vemos que lhe pertencemos e ajudamos a fazê-lo.

Então, aquilo que descobrimos passando diariamente para cima e para baixo no carreiro nunca deixa de nos deleitar e enriquecer. A cantata de Bach que oiço, quando tenho tempo, de manhã. Ou a história do evangelho de hoje. O amor de Maria por Jesus é silenciosamente derramado quando ela Lhe unge os pés, com um perfume precioso. O nardo alivia o stress e a ansiedade. Enquanto ela aplica o unguento nos seus pés, as suas lágrimas escorrem e ela seca-as com os cabelos. É a mais íntima descrição física de Jesus que viajou ao longo da tradição, assim como o Caminho em que Ele se tornou e pelo qual ainda caminhamos.

“E a casa encheu-se com a fragância do perfume” (Jo 12:3). Não apenas a casa, mas o tempo.
 

Laurence
 




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Domingo de Ramos - Quaresma 2021

28/3/2021

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Quaresma 2021 - Domingo de Ramos

(Evangelho Mc 11:1-11. Outros espalharam ramos de verdura que tinham cortado nos campos.)
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E ao aproximarem-se de Jerusalém, perto de Betfagé e de Betânia, junto ao Monte das Oliveiras, Jesus envia dois dos Seus discípulos e diz-lhes: “Ide à aldeia que está à vossa frente, logo que lá entrardes, encontrareis preso um pequeno jumento, no qual ainda ninguém montou. Soltai-o e trazei-o.

Vamos começar o retiro da Páscoa online na quinta-feira, quando duas correntes do tempo, a mundana e a sagrada, fluem poderosamente juntas. É como o Encontro das Águas na Amazónia, onde o Rio Negro e o Amazonas correm juntos, lado a lado, no mesmo canal ao longo de várias milhas antes de se misturarem. Mas a mudança começa hoje, Domingo de Ramos, o início da Semana Santa. Com a entrada de Jesus em Jerusalém, sentado num jumento, aclamado pelas multidões, começamos a ser levados pela rápida corrente dos mistérios da Páscoa. Cada um dos quatro evangelhos comungam da importância simbólica desta entrada triunfal, que precedeu a rejeição e a derrota.

Podemos ouvir a tradição oral da história na versão escrita. Existem detalhes que não entendemos; sentimo-nos excluídos. Estamos a ouvir uma conversa entre pessoas que partilham detalhes e um sentido do significado simbólico que a nós nos parece alheio. Na realidade, é bom sentirmo-nos desconfortáveis porque estamos a entrar num país novo. Uma vez, aterrei no aeroporto de Deli, na Índia, e vi um grupo de turistas americanos traumatizados pelo choque total do ambiente físico e cultural. Quando já estávamos fora do terminal, reparei numa mulher que estava a afastar-se. Enquanto esperavam o retorno do guia turístico e a chegada do autocarro, ela foi cercada por vendedores intrusivos e mendigos aleijados, de mãos estendidas a querer agarrá-la. Passado pouco tempo ela colapsou totalmente, foi a correr de volta para o aeroporto e disse que ia voltar para casa. O seu momento de encontro com a Mãe India ainda não tinha chegado.

A Semana Santa é a nossa chegada numa tradição. A estranheza que sentimos é em si mesma, parte do processo transformador dos Mistérios da Páscoa. Estamos a conectar-nos com uma história, uma família, uma transmissão, às quais podemos sentir-nos alheios, estrangeiros. Mas suspendam o ceticismo racional e o choque cultural, por um tempo. Aguardem o regresso do guia turístico, deixem uma imaginação e intuição mais profundas fluir lado a lado com a consciência habitual e o sentido de alienação muda para um sentido de descoberta, uma nova dimensão de casa.
be” mais “longing” (ser mais ansiar). A Páscoa, dolorosa e alegremente, expõe o nosso mais forte e mais autodefenidor anseio. E convoca-nos para a experiência de ser, numa estranha e no entanto íntima plenitude.

O que há de importante no facto de Jesus dar instruções logísticas sobre os seus meios de transporte? Para a primeira geração, isso simbolizava o Rei da tradição bíblica a entrar na sua própria cidade, a chegar a casa de um modo apenas permitido ao rei. “Não tenhas medo, filha de Sião. Olha, o teu rei está a chegar sentado num jumento” (Jo 12:15).

E muitos estenderam as capas pelo caminho; outros, ramos de verdura cortados dos campos. E os que iam à frente e os que os seguiam atrás gritavam: “Hosana! Bendito Aquele que vem em nome do Senhor! Bendito é o reino do nosso pai David que está a chegar!”

Somos mais do que bisbilhoteiros. Sabemos mais do que eles sabiam. Ele não era um salvador nacionalista prometendo a expulsão da potência ocupante. Ele estava a mostrar à Humanidade em geral que todos ansiamos pela mesma coisa. Realizamo-nos todos pela pura experiência de ser. Todos pertencemos. Somos um.


Laurence


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Sábado da Quinta Semana - Quaresma 2021

27/3/2021

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Quaresma 2021 - Sábado da Quinta Semana
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(Evangelho Jo 11:45-56. “Para congregar na unidade todos os filhos de Deus, que andavam dispersos…)

 
Amamos heróis e estamos constantemente a inventar novos heróis. No ecrã, na política ou nas nossas vidas pessoais, idealizamos as vítimas infelizes dos nossos anseios heroicos. Nós não acreditamos que somos heróis: conhecemo-nos bem demais, mas para entender a vida, deveríamos tentar ver o mito heroico que está representado na experiência de cada um. A Quaresma pode não nos ter feito sentir uns super-heróis espirituais, esperemos, mas para compreender a história da Páscoa onde vamos re-entrar em breve, precisamos de compreender esse arquétipo. O crucificado Jesus apresenta-se como uma escolha estranha como herói, a não ser como uma espécie de anti-herói conspícuo pelo seu fracasso. Mas seguramente não um Super-homem.

O meu herói favorito é Gilgamesh (2000 AC), Rei de Uruk na Mesopotâmia. Encontramo-lo na obra mais antiga da literatura. Como nós, ele é dois terços deus e um terço humano. Porque ele é um governante opressor, os deuses enviam um homem selvagem, Enkidu, para o corrigir. Eles lutam entre si. Gilgamesh vence, mas eles formam uma amizade perfeita. Partem em demandas heroicas e, ao fazê-lo, enfurecem os deuses que tiram a vida a Enkidu. Gilgamesh parte numa viagem solitária e perigosa em busca do segredo da vida eterna. Ele fracassa, mas é-lhe ensinada a sabedoria da mortalidade: “A vida, que procuras, jamais a encontrarás. Pois quando os deuses criaram o homem, eles permitiram que a morte fosse parte da experiência, e a vida fosse retida nas suas próprias mãos.” Ele retorna a casa, mais sábio, mais humilde e um melhor governante.

Três elementos essenciais de significado heroico são refletidos nesta história de Gilgamesh: separação, iniciação e retorno. Os nossos heróis Super-homens distraem-nos do significado heroico que enobrece até a vida mais banal. Eles expressam uma enorme inflação do ego, a fantasia do poder e do domínio. Eles não são mestres nem reveladores da nossa verdade, mas fantasias requintadas a exigir adoração. Assim como os deuses antigos, que estão continuamente a assumir novas formas nas culturas humanas, eles dominam-nos e exploram-nos, mas são co-dependentes das ofertas que levamos. Sem a nossa adoração e sacrifícios, eles desvanecem como as velhas estrelas de cinema.

Gilgamesh ajuda-nos a entender a história da Páscoa, se virmos que Jesus não é um super-herói nem um deus, mas revela o que significa a vida humana mais completamente do que qualquer mito ou obra de ficção. No entanto, assim como cada ser humano ao descobrir quem é, de onde veio e para onde vai, ele separa-se progressivamente. Em última instância, Ele separa-se de tudo o resto. Com cada grau de separação que enfrentamos, também passamos por uma iniciação. A morte é a suprema iniciação. Recuperamos – retornamos – após cada ciclo. O retorno último que transcende o processo cíclico é a Ressurreição.

Jesus não requer adoração de herói porque ele heroicamente ilumina a nossa autocompreensão.


Laurence




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Sexta-feira da Quinta Semana - Quaresma 2021

26/3/2021

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Quaresma 2021 - Sexta-feira da Quinta Semana

(Evangelho Jo 10:31-42. Procuraram então de novo prendê-lo, mas ele saiu-lhes das mãos.)
 
Estamos a aproximar-nos do fim da Quaresma e do início da Semana Santa. É uma boa altura, se para tal estivermos inclinados, para rever e avaliar o que é que nos ensinaram as últimas seis semanas. Mudou alguma coisa? Vemos alguma coisa de forma diferente? Sentimo-nos mais livres ou menos? Que padrões permanecem intratáveis? Onde ficaram mais soltos?

Qualquer ponto de uma reflexão séria sobre o significado da experiência é como o deus Jano. Para os Romanos ele era o deus das portas e passagens, dos fins e dos começos. Cada porta é uma via de entrada, uma via de saída e uma passagem. Cada janela pode permitir a vista para dentro e para fora e através dela.

Refletir sobre o significado é um meio de passar o tempo mas não deveria tomar todo o nosso tempo, caso contrário ficaríamos sem tempo para viver. Viver plenamente significa retirar a atenção de nós mesmos. Em vez de nos mantermos no centro de todas as cenas expressando grandes solilóquios, permitirmos a nós mesmos sermos um participante menor ou até sairmos de cena. O significado então surge como uma experiência de íntima conexão com dimensões da realidade além daquela que nos obceca, nomeadamente nós mesmos. Como resultado, tornamo-nos mais claramente conscientes de nós próprios por ativarmos a nossa visão periférica a qual inclui a maior parte do nosso campo visual. Vemos em mais direções. Retirar a atenção de nós mesmos como um ponto fixo de auto-observação permite-nos ver e saber melhor.

No decorrer destes dias, no Evangelho, Jesus é descrito como estando a aproximar-se de Jerusalém, o princípio da Sua Paixão e o fim da Sua vida. Ele está perfeitamente ciente do que está vindo na Sua direção, à medida que se aproxima. Em muitas tradições, o iluminado, aquele que alcança todo o campo de visão, sabe da aproximação da sua morte.

Ao pensar nisto, lembrei-me da frase “eventos vindouros lançam as suas sombras diante deles”. Curioso quanto à sua origem, fui conduzido para um quadro com esse título, de um artista canadiano do séc. XIX (Charles Caleb Ward) das províncias do Leste rural. Trata-se de uma cena simples, mas comovedora, de uma família pobre a olhar para um cartaz que anunciava a chegada iminente do Circo Barnum. Retrata coisas curiosas e bizarras, como múmias egípcias e cavalos com chifres, nada comuns em New Brunswick. Coisas excitantes, fora do normal, que criam fortes expectativas. Visíveis aos nossos olhos estão restos de cartazes antigos rasgados que prometem futuros passados. Por detrás dos pais e de dois dos seus filhos, está uma terceira criança, um rapaz absorto, não no cartaz e nas coisas por vir, mas numa boneca que ele tem nas mãos. A sua imaginação está agora despertando dentro dele. Para os outros, ela é externalizada e projetada no futuro.

A única outra figura que resta é um cão deitado no chão ao lado do rapaz, que olha para nós como o deus.

Laurence


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