
Quaresma 2021 - Sexta-feira da Quarta Semana
(Evangelho: Mt 1:16,18-21,24. “O seu marido José, que era um homem honrado…”)
Einstein disse que só observamos aquilo que as nossas teorias nos permitem observar. Estamos cheios de ângulos mortos, mesmo quando podemos ter um foco nítido numa porção daquilo que está diante de nós. A investigação sobre a percepção mostra que fenómenos totalmente novos e inesperados podem ser completamente apagados, mesmo perante a atenção de um grupo inteiro de pessoas, porque o cérebro não sabe como lidar com eles. O que não sabemos, não sabemos e, se soubéssemos realmente aquilo que não sabemos, saberíamos tudo. Por isso, vivemos com as nossas limitações.
Hoje é a Festa de S. José, carpinteiro, marido de Maria, patrono dos trabalhadores manuais. Ele está habitualmente no nosso ângulo morto quando lemos a primeira parte da história dos Evangelhos, após a qual ele desaparece inteiramente da fotografia. Porém, nas poucas palavras que descrevem a sua decisão de não pôr a sua prometida grávida de lado e em vergonha, ele encontrou uma imortalidade mítica, inúmeros santuários, biografias especulativas e, recentemente, um lugar em que é nomeado no cânone da Missa Romana.
Seria difícil não gostar de S. José, embora ele tenha um papel secundário. Ele não é uma estrela. É como o operário que vem a nossa casa reparar alguma coisa que nos tem estado a causar muitos incómodos e que não temos conseguido arranjar. O seu superior conhecimento e capacidade dão-lhe um toque sobrenatural. Ele faz o trabalho sozinho, tranquilamente, depois de o avaliar e de decidir o que precisa. Cobra modestamente e vai-se embora parecendo deslisar como um anjo que já entregou a sua mensagem, aceitando os nossos profusos agradecimentos sem espalhafato. Um modelo de bom trabalho que gostaríamos de imitar em qualquer trabalho, provavelmente menos útil, que possamos estar a fazer.
Um bom operário, bem como uma boa trabalhadora manual, merece o que cobra e o respeito por aquilo que faz. Ele lembra-nos de que tudo o que temos que fazer é aquilo que é suposto fazermos e fazê-lo sem ganância ou um desejo egotista de aprovação. Um trabalho bem feito é em si a sua própria recompensa e traz benefícios aos outros. José lidou com o problema de arranjar sítio para ficarem em Belém, o problema dos visitantes reais, a fuga apressada para o exílio, o regresso a Nazaré e a criação de um negócio que providenciasse o sustento da família. Numa tradução, Cassiano chama ao meditante o “contador de contas de Deus”, significando o monge simples cujo trabalho era dizer orações, contar as suas contas. Repetir o mantra é bom trabalho. Tal como o trabalho manual, ele envolve a totalidade da pessoa, corpo e mente. Não afaga o ego, bem pelo contrário. É a sua própria recompensa.
Teria sido culturalmente estranho para a época se Maria tivesse sido a carpinteira e José o dono de casa. Mas hoje os papéis de género são mais flexíveis e permitem que, tanto homens como mulheres, façam o tipo de trabalho que melhor se lhes adequa. O marido de uma mulher ambiciosamente poderosa e bem-sucedida contou-me que ele e os filhos sempre tinham preferido que fosse ele a governar a casa e a família porque ele o fazia melhor do que a sua mulher. Os consortes de mulheres em posições de poder que eu conheço espantam-me com a sua integração pessoal e confiança masculina, num papel de suporte de retaguarda que o estereotipo atribui às mulheres.
Tudo o que importa é que reconheçamos o que é suposto fazermos e termos a coragem de o fazer com todo o coração. Todos temos ângulos mortos culturais e vaidades com que lidar. Mas a meditação tem um jeito para os remover e para nos ajudar a ver o que está diante dos nossos olhos.
Laurence
Reflexões para a Quaresma 2021 - LAURENCE FREEMAN OSB
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
Site: http://www.meditacaocrista.com/
Facebook: https://www.facebook.com/meditacaocristaportugal
YouTube: https://www.youtube.com/user/meditacaocristaTv
(Evangelho: Mt 1:16,18-21,24. “O seu marido José, que era um homem honrado…”)
Einstein disse que só observamos aquilo que as nossas teorias nos permitem observar. Estamos cheios de ângulos mortos, mesmo quando podemos ter um foco nítido numa porção daquilo que está diante de nós. A investigação sobre a percepção mostra que fenómenos totalmente novos e inesperados podem ser completamente apagados, mesmo perante a atenção de um grupo inteiro de pessoas, porque o cérebro não sabe como lidar com eles. O que não sabemos, não sabemos e, se soubéssemos realmente aquilo que não sabemos, saberíamos tudo. Por isso, vivemos com as nossas limitações.
Hoje é a Festa de S. José, carpinteiro, marido de Maria, patrono dos trabalhadores manuais. Ele está habitualmente no nosso ângulo morto quando lemos a primeira parte da história dos Evangelhos, após a qual ele desaparece inteiramente da fotografia. Porém, nas poucas palavras que descrevem a sua decisão de não pôr a sua prometida grávida de lado e em vergonha, ele encontrou uma imortalidade mítica, inúmeros santuários, biografias especulativas e, recentemente, um lugar em que é nomeado no cânone da Missa Romana.
Seria difícil não gostar de S. José, embora ele tenha um papel secundário. Ele não é uma estrela. É como o operário que vem a nossa casa reparar alguma coisa que nos tem estado a causar muitos incómodos e que não temos conseguido arranjar. O seu superior conhecimento e capacidade dão-lhe um toque sobrenatural. Ele faz o trabalho sozinho, tranquilamente, depois de o avaliar e de decidir o que precisa. Cobra modestamente e vai-se embora parecendo deslisar como um anjo que já entregou a sua mensagem, aceitando os nossos profusos agradecimentos sem espalhafato. Um modelo de bom trabalho que gostaríamos de imitar em qualquer trabalho, provavelmente menos útil, que possamos estar a fazer.
Um bom operário, bem como uma boa trabalhadora manual, merece o que cobra e o respeito por aquilo que faz. Ele lembra-nos de que tudo o que temos que fazer é aquilo que é suposto fazermos e fazê-lo sem ganância ou um desejo egotista de aprovação. Um trabalho bem feito é em si a sua própria recompensa e traz benefícios aos outros. José lidou com o problema de arranjar sítio para ficarem em Belém, o problema dos visitantes reais, a fuga apressada para o exílio, o regresso a Nazaré e a criação de um negócio que providenciasse o sustento da família. Numa tradução, Cassiano chama ao meditante o “contador de contas de Deus”, significando o monge simples cujo trabalho era dizer orações, contar as suas contas. Repetir o mantra é bom trabalho. Tal como o trabalho manual, ele envolve a totalidade da pessoa, corpo e mente. Não afaga o ego, bem pelo contrário. É a sua própria recompensa.
Teria sido culturalmente estranho para a época se Maria tivesse sido a carpinteira e José o dono de casa. Mas hoje os papéis de género são mais flexíveis e permitem que, tanto homens como mulheres, façam o tipo de trabalho que melhor se lhes adequa. O marido de uma mulher ambiciosamente poderosa e bem-sucedida contou-me que ele e os filhos sempre tinham preferido que fosse ele a governar a casa e a família porque ele o fazia melhor do que a sua mulher. Os consortes de mulheres em posições de poder que eu conheço espantam-me com a sua integração pessoal e confiança masculina, num papel de suporte de retaguarda que o estereotipo atribui às mulheres.
Tudo o que importa é que reconheçamos o que é suposto fazermos e termos a coragem de o fazer com todo o coração. Todos temos ângulos mortos culturais e vaidades com que lidar. Mas a meditação tem um jeito para os remover e para nos ajudar a ver o que está diante dos nossos olhos.
Laurence
Reflexões para a Quaresma 2021 - LAURENCE FREEMAN OSB
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
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