
Quarto Domingo da Quaresma
Mas era forçoso que festejássemos e nos alegrássemos, porque este teu irmão estava morto e ganhou vida; estava perdido e está encontrado. (Lucas 15:1-32)
O Filho Pródigo é uma das melhores histórias curtas jamais contadas. É uma das melhores parábolas de Jesus. Uma boa história cria personagens que sentimos como reais porque nos permitem identificarmo-nos com elas e, assim, aprendermos sobre nós mesmos. Após imersão numa grande história – pensem numa peça de Shakespeare ou até numa boa série da Netflix – sentimos que ficamos a conhecer melhor a nossa própria vida e o mundo. Nós reconhecemos algo novo. As personagens que tornam isto possível parecem-nos “reais”, apesar de sabermos que são imaginárias. Mas são imaginadas a partir da vida. Uma das características das pessoas da vida real é que elas são variáveis e surpreendem-nos. Não estão vinculadas aos estereótipos que lhes atribuímos. Acima de tudo elas têm uma vida fora de nós.
Pensem nas personagens da parábola. O filho mais novo (o ego do tipo “vamos a isto já”) quer a sua herança e põe-se a andar e desperdiça-a. No chiqueiro ele cai em si. Mas não se trata de um arrependimento genuíno. Ele apenas percebe que pode voltar para casa mostrando-se arrependido, fazendo o seu pai de coração-mole acreditar que ele mudou e voltando a viver confortavelmente outra vez. Deve ter ficado espantado quando o seu pai nem sequer ouviu as suas palavras piedosas, mas em êxtase abraçou-o e beijou-o. O irmão mais velho (o ego do tipo “eu sou melhor do que tu”) percebe o que aconteceu e está furioso. Sente-se ciumento e ressentido porque nunca foi alvo de uma demonstração de amor como a que foi derramada sobre o seu irmão pródigo. A sua prima direita provavelmente chama-se Marta.
E o Pai. A história expande a sua imensa realidade em três níveis. Ele respeita a liberdade do seu filho mais novo sem questionar e dá-lhe a sua herança para fazer o que bem entender. Dá-lhe as boas-vindas a casa com um transbordante alívio e toda a alegria do amor expressa em ainda mais uma festa – daquelas de que os evangelhos estão repletos. Ele ensina ao seu ciumento filho mais velho que não é menos amado do que o seu irmão e ele que não tem prediletos (como S. Paulo diz de Deus). Com uns poucos golpes Jesus comprime grande teo-psicologia tal como o carvão é comprimido em diamantes. Eles vão juntos porque o autoconhecimento é a base do nosso conhecimento de Deus.
Porque será que Deus permite a Putin fazer o que quer? O Alcorão diz que Deus fez os homens livres para nos aperfeiçoarmos a nós mesmos. Eu estava a fantasiar no outro dia sobre Putin acordar com autoconhecimento. Tendo nos dado a sua própria natureza livre, Deus no entanto influencia-nos e salva-nos pelo amor transformador, o qual apenas aprendemos a reconhecer dolorosamente devagar. E ele arranca o decadente dente do egoísmo mostrando-nos que somos amados de um modo único mas, peço desculpa, não exclusivamente. O nacionalismo provoca guerras, ridiculamente, porque elas não são necessárias. Há o suficiente de tudo para satisfazer a todos. A diversidade e a liberdade alimentam o festim da existência, não o ameaçam.
Quando me afasto de uma grande história, sinto-me triste. O mundo real não é tão simples nem positivo. Mas então parece diferente quando sinto que o que absorveu a minha atenção alterou o meu modo de ver e de estar no mundo, porque cada personagem da história era eu e cada situação era uma situação da qual eu já fiz parte.
Laurence
Reflexões para a Quaresma 2021 - LAURENCE FREEMAN OSB
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
Site: http://www.meditacaocrista.com/
Facebook: https://www.facebook.com/meditacaocristaportugal
YouTube: https://www.youtube.com/user/meditacaocristaTv
Mas era forçoso que festejássemos e nos alegrássemos, porque este teu irmão estava morto e ganhou vida; estava perdido e está encontrado. (Lucas 15:1-32)
O Filho Pródigo é uma das melhores histórias curtas jamais contadas. É uma das melhores parábolas de Jesus. Uma boa história cria personagens que sentimos como reais porque nos permitem identificarmo-nos com elas e, assim, aprendermos sobre nós mesmos. Após imersão numa grande história – pensem numa peça de Shakespeare ou até numa boa série da Netflix – sentimos que ficamos a conhecer melhor a nossa própria vida e o mundo. Nós reconhecemos algo novo. As personagens que tornam isto possível parecem-nos “reais”, apesar de sabermos que são imaginárias. Mas são imaginadas a partir da vida. Uma das características das pessoas da vida real é que elas são variáveis e surpreendem-nos. Não estão vinculadas aos estereótipos que lhes atribuímos. Acima de tudo elas têm uma vida fora de nós.
Pensem nas personagens da parábola. O filho mais novo (o ego do tipo “vamos a isto já”) quer a sua herança e põe-se a andar e desperdiça-a. No chiqueiro ele cai em si. Mas não se trata de um arrependimento genuíno. Ele apenas percebe que pode voltar para casa mostrando-se arrependido, fazendo o seu pai de coração-mole acreditar que ele mudou e voltando a viver confortavelmente outra vez. Deve ter ficado espantado quando o seu pai nem sequer ouviu as suas palavras piedosas, mas em êxtase abraçou-o e beijou-o. O irmão mais velho (o ego do tipo “eu sou melhor do que tu”) percebe o que aconteceu e está furioso. Sente-se ciumento e ressentido porque nunca foi alvo de uma demonstração de amor como a que foi derramada sobre o seu irmão pródigo. A sua prima direita provavelmente chama-se Marta.
E o Pai. A história expande a sua imensa realidade em três níveis. Ele respeita a liberdade do seu filho mais novo sem questionar e dá-lhe a sua herança para fazer o que bem entender. Dá-lhe as boas-vindas a casa com um transbordante alívio e toda a alegria do amor expressa em ainda mais uma festa – daquelas de que os evangelhos estão repletos. Ele ensina ao seu ciumento filho mais velho que não é menos amado do que o seu irmão e ele que não tem prediletos (como S. Paulo diz de Deus). Com uns poucos golpes Jesus comprime grande teo-psicologia tal como o carvão é comprimido em diamantes. Eles vão juntos porque o autoconhecimento é a base do nosso conhecimento de Deus.
Porque será que Deus permite a Putin fazer o que quer? O Alcorão diz que Deus fez os homens livres para nos aperfeiçoarmos a nós mesmos. Eu estava a fantasiar no outro dia sobre Putin acordar com autoconhecimento. Tendo nos dado a sua própria natureza livre, Deus no entanto influencia-nos e salva-nos pelo amor transformador, o qual apenas aprendemos a reconhecer dolorosamente devagar. E ele arranca o decadente dente do egoísmo mostrando-nos que somos amados de um modo único mas, peço desculpa, não exclusivamente. O nacionalismo provoca guerras, ridiculamente, porque elas não são necessárias. Há o suficiente de tudo para satisfazer a todos. A diversidade e a liberdade alimentam o festim da existência, não o ameaçam.
Quando me afasto de uma grande história, sinto-me triste. O mundo real não é tão simples nem positivo. Mas então parece diferente quando sinto que o que absorveu a minha atenção alterou o meu modo de ver e de estar no mundo, porque cada personagem da história era eu e cada situação era uma situação da qual eu já fiz parte.
Laurence
Reflexões para a Quaresma 2021 - LAURENCE FREEMAN OSB
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