
Sexta-feira da Quarta Semana
A cintilação da verdade despida do “eu” é a maior austeridade
As notícias sobre as conversações de paz na Turquia, entre russos e ucranianos, estão no topo da atualidade. Uma centelha bem-vinda de esperança. Qualquer raio de esperança ajuda a evitar o cinismo e o endurecimento do coração. Porém, é um alívio ouvir que os ucranianos não se estão a agarrar a falsas esperanças. “Vamos julgar Putin”, dizem eles, “que disse que não tinha intenção de invadir a Ucrânia até ao dia em que o fez; pelas ações das suas forças invasoras, não pelas suas palavras.”
Quando a mente sucumbe às suas forças de sombra – desespero, raiva, ciúme, orgulho, luxúria, só para nomear algumas – já não se pode confiar em que vá fazer bons julgamentos. Inevitavelmente, as decisões que tomamos em tais estados mentais pioram as coisas. As coisas já estão piores quando não conseguimos identificar e chamar pelo nome as forças escuras que nos ocupam. Como é que se negoceia com alguém sem qualquer autoconsciência crítica? É a escassez de confiança e, sem confiança, as relações humanas dissolvem-se.
Na nossa emergência lenta da era Covid, estamos a despertar para as mudanças que ela fez. Não apenas nos padrões de trabalho e nas formas de comunicar, mas para a saúde mental em geral, não menos importante nas crianças. Medicalizámos a saúde mental, tal como fizemos com a maior parte dos aspetos da saúde, muitas vezes reduzindo-a a um problema que a medicação pode resolver. Uma vez, uma estudante contou-me que foi ao seu médico para lhe explicar como se sentia mal depois da morte da sua avó, a quem era muito ligada, e da infidelidade do namorado, em quem tinha depositado a sua confiança. Antes de ter terminado de falar, ele já tinha passado uma receita e disse-lhe que voltasse dentro de um mês.
Enquanto humanos somos entidades compostas governadas por leis físicas, mentais e espirituais. Se deixarmos qualquer uma destas dimensões entretecidas fora da equação, ela torna-se desequilibrada em todas as dimensões.
Há alguns anos o Vaticano, numa fase particularmente pouco saudável, expressou a sua desaprovação a que houvesse mulheres diretoras espirituais em seminários para padres. Uma irmã que eu conhecia, que era uma guia espiritual muito amada e respeitada num grande seminário, contou-me que lhes tinham dito para se prepararem para uma inspeção de Roma. Quando o bispo-examinador chegou o pessoal do seminário reuniu-se para o saudar. Ele entrou afavelmente e deu uma volta apertando a mão a toda a gente, exceto às mulheres.
Como é que negociamos com os fanáticos, os desonestos, aqueles em quem não se pode confiar, os mentalmente-doentes? Não fingindo que as coisas estão normais quando não o estão. Falando verdade, como os ucranianos estão a fazer nas suas negociações hoje. Como Jesus fez durante os Seus julgamentos em tribunal.
Compreendendo o dito de Ramana citado acima. A verdade cintila quando as sombrias forças do ego são postas fora. Então, num espaço simples e transparente, sem cantos escuros onde as sombras se possam esconder, uma grande e corretiva austeridade se revela.
Laurence
Reflexões para a Quaresma 2021 - LAURENCE FREEMAN OSB
Comunidade Mundial para a Meditação Cristã - Portugal
Site: http://www.meditacaocrista.com/
Facebook: https://www.facebook.com/meditacaocristaportugal
YouTube: https://www.youtube.com/user/meditacaocristaTv
A cintilação da verdade despida do “eu” é a maior austeridade
As notícias sobre as conversações de paz na Turquia, entre russos e ucranianos, estão no topo da atualidade. Uma centelha bem-vinda de esperança. Qualquer raio de esperança ajuda a evitar o cinismo e o endurecimento do coração. Porém, é um alívio ouvir que os ucranianos não se estão a agarrar a falsas esperanças. “Vamos julgar Putin”, dizem eles, “que disse que não tinha intenção de invadir a Ucrânia até ao dia em que o fez; pelas ações das suas forças invasoras, não pelas suas palavras.”
Quando a mente sucumbe às suas forças de sombra – desespero, raiva, ciúme, orgulho, luxúria, só para nomear algumas – já não se pode confiar em que vá fazer bons julgamentos. Inevitavelmente, as decisões que tomamos em tais estados mentais pioram as coisas. As coisas já estão piores quando não conseguimos identificar e chamar pelo nome as forças escuras que nos ocupam. Como é que se negoceia com alguém sem qualquer autoconsciência crítica? É a escassez de confiança e, sem confiança, as relações humanas dissolvem-se.
Na nossa emergência lenta da era Covid, estamos a despertar para as mudanças que ela fez. Não apenas nos padrões de trabalho e nas formas de comunicar, mas para a saúde mental em geral, não menos importante nas crianças. Medicalizámos a saúde mental, tal como fizemos com a maior parte dos aspetos da saúde, muitas vezes reduzindo-a a um problema que a medicação pode resolver. Uma vez, uma estudante contou-me que foi ao seu médico para lhe explicar como se sentia mal depois da morte da sua avó, a quem era muito ligada, e da infidelidade do namorado, em quem tinha depositado a sua confiança. Antes de ter terminado de falar, ele já tinha passado uma receita e disse-lhe que voltasse dentro de um mês.
Enquanto humanos somos entidades compostas governadas por leis físicas, mentais e espirituais. Se deixarmos qualquer uma destas dimensões entretecidas fora da equação, ela torna-se desequilibrada em todas as dimensões.
Há alguns anos o Vaticano, numa fase particularmente pouco saudável, expressou a sua desaprovação a que houvesse mulheres diretoras espirituais em seminários para padres. Uma irmã que eu conhecia, que era uma guia espiritual muito amada e respeitada num grande seminário, contou-me que lhes tinham dito para se prepararem para uma inspeção de Roma. Quando o bispo-examinador chegou o pessoal do seminário reuniu-se para o saudar. Ele entrou afavelmente e deu uma volta apertando a mão a toda a gente, exceto às mulheres.
Como é que negociamos com os fanáticos, os desonestos, aqueles em quem não se pode confiar, os mentalmente-doentes? Não fingindo que as coisas estão normais quando não o estão. Falando verdade, como os ucranianos estão a fazer nas suas negociações hoje. Como Jesus fez durante os Seus julgamentos em tribunal.
Compreendendo o dito de Ramana citado acima. A verdade cintila quando as sombrias forças do ego são postas fora. Então, num espaço simples e transparente, sem cantos escuros onde as sombras se possam esconder, uma grande e corretiva austeridade se revela.
Laurence
Reflexões para a Quaresma 2021 - LAURENCE FREEMAN OSB
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